"Penso diariamente em suicídio", escreveu brother Adrilles em texto de 2004
Do UOL, em São Paulo
"Intelectual" da edição 2015 do "BBB", o mineiro e poeta Adrilles Jorge já publicou um texto no blog do dramaturgo Gerald Thomas. O tema: as angústias que levam ao suicídio.
"Penso diariamente em suicídio. Por mais absurdo que possa parecer, é a única maneira de manter minha lucidez", escreveu Adrilles, em texto de 2004.
Nos comentários, o brother afirmou ainda que "não fuma nem bebe" e descreveu-se como "um utópico que não teme o próprio ridículo".
"O ceticismo, por si só, já cansou há muito. Basta de iconoclastas, o que precisamos agora é de inventores, caro amigo. Ainda que sejam destruídos amanhã."
O texto, que cita o poeta irlandês William Butler Yeats e diz que é preciso "ser infantilmente utópico" e "lutar contra moinhos de vento", ganhou elogios de Thomas. "Que texto lindo! Caramba! Lindo. Que bom ter insistido. Suicidio é minha praia."
Leia a íntegra abaixo.
SOBRE ALGO
Penso diariamente em suicídio. Por mais absurdo que possa parecer, é a única maneira de manter minha lucidez. É difícil conviver com a falta de sentido e do total esgotamento intelectual humano. Todos os humanismos foram contestados, todos os sistemas políticos, toda a filosofia, absolutamente tudo foi posto em cheque no século passado.
O que sobrou? Nada mais que este porre absoluto chamado relativismo. Dá até saudade de um certo conservadorismo que dizia (que ainda diz) que há princípios incontestáveis, que há valores indiscutíveis.
Mas não dá para voltar atrás. Como acreditar piamente em uma moral cristã depois de Nietzsche? Como pensar em uma república utópica de Platão depois de termos inventado esta mídia imoral que fabrica meias verdades? (Fatos, eles dizem, atenham-se aos fatos. Mas o que são os fatos sem uma compreesão maior? ''Os fatos me entediam'', já dizia Paul Valéry). A história das idéias parece ser uma constante humilhação de teses passadas, uma permanente autofagia que se alimenta de si própria e nos lança, cada vez mais , em um vácuo.
Não sou cético, apesar de o parecer. Meu problema é justamente este:tenho esperança. Em princípio, todos (os que permanecem vivos) temos. Me alimento exclusivamente deste câncer ''salutar'' chamado esperança. É preciso saber tirar lições do absurdo em que vivemos. É urgente a criação de uma nova didática que obedeça aos moldes da arte. Sim, da arte mesmo.Platão expulsou os artistas de sua ''república''. Talvez fosse melhor expulsar os pensadores. Não há mais espaço para um pensamento cartesiano, lógico, racional. É preciso reinventar o modo de se pensar, e talvez este modo seja a poesia. As tensões da nossa era ''pragmática'' estão se rompendo. Vivemos em um mundo bárbaro travestido de civilização.''O mais forte sobrevive''. Força econômica, força de poder. Nada mais. Apenas um arremedo do sistema feudal da idade média. E ainda nos chamamos de ''pós-modernos''.
Vivemos, aparentemente, em um mundo supostamente melhor do que foi antes. Aqui, na terrinha, desfrutamos de um regime democrático que dá voz a todos. Mas de que adianta o direito à voz, se quase ninguém tem o que dizer? Não há voz, mas apenas um grunhido animalesco e inaudível. O que se observa é uma multidão de apáticos que seguem ordinariamente a voz daqueles que JULGAM ter razão, o que é muito pior. Yeats dizia que ''os piores sempre são radicais, enquanto aos melhores falta convicção''. Tendo a concordar.
E ficamos nós aqui, intelectuaizinhos desencantados mastigando nossa própria desilusão. É preciso agir, é preciso sim ser infantilmente utópico, é preciso lutar contra moinhos de vento, é preciso ser patética e ridiculamente quixotesco. Ou então seremos esmagados por esta razão medíocre, por esta sanidade tediosa que nos ensinam desde o berço e que deu no que deu. Cá para mim, prefiro o meu ridículo.
Adrilles Jorge
Penso diariamente em suicídio. Por mais absurdo que possa parecer, é a única maneira de manter minha lucidez. É difícil conviver com a falta de sentido e do total esgotamento intelectual humano. Todos os humanismos foram contestados, todos os sistemas políticos, toda a filosofia, absolutamente tudo foi posto em cheque no século passado.
O que sobrou? Nada mais que este porre absoluto chamado relativismo. Dá até saudade de um certo conservadorismo que dizia (que ainda diz) que há princípios incontestáveis, que há valores indiscutíveis.
Mas não dá para voltar atrás. Como acreditar piamente em uma moral cristã depois de Nietzsche? Como pensar em uma república utópica de Platão depois de termos inventado esta mídia imoral que fabrica meias verdades? (Fatos, eles dizem, atenham-se aos fatos. Mas o que são os fatos sem uma compreesão maior? ''Os fatos me entediam'', já dizia Paul Valéry). A história das idéias parece ser uma constante humilhação de teses passadas, uma permanente autofagia que se alimenta de si própria e nos lança, cada vez mais , em um vácuo.
Não sou cético, apesar de o parecer. Meu problema é justamente este:tenho esperança. Em princípio, todos (os que permanecem vivos) temos. Me alimento exclusivamente deste câncer ''salutar'' chamado esperança. É preciso saber tirar lições do absurdo em que vivemos. É urgente a criação de uma nova didática que obedeça aos moldes da arte. Sim, da arte mesmo.Platão expulsou os artistas de sua ''república''. Talvez fosse melhor expulsar os pensadores. Não há mais espaço para um pensamento cartesiano, lógico, racional. É preciso reinventar o modo de se pensar, e talvez este modo seja a poesia. As tensões da nossa era ''pragmática'' estão se rompendo. Vivemos em um mundo bárbaro travestido de civilização.''O mais forte sobrevive''. Força econômica, força de poder. Nada mais. Apenas um arremedo do sistema feudal da idade média. E ainda nos chamamos de ''pós-modernos''.
Vivemos, aparentemente, em um mundo supostamente melhor do que foi antes. Aqui, na terrinha, desfrutamos de um regime democrático que dá voz a todos. Mas de que adianta o direito à voz, se quase ninguém tem o que dizer? Não há voz, mas apenas um grunhido animalesco e inaudível. O que se observa é uma multidão de apáticos que seguem ordinariamente a voz daqueles que JULGAM ter razão, o que é muito pior. Yeats dizia que ''os piores sempre são radicais, enquanto aos melhores falta convicção''. Tendo a concordar.
E ficamos nós aqui, intelectuaizinhos desencantados mastigando nossa própria desilusão. É preciso agir, é preciso sim ser infantilmente utópico, é preciso lutar contra moinhos de vento, é preciso ser patética e ridiculamente quixotesco. Ou então seremos esmagados por esta razão medíocre, por esta sanidade tediosa que nos ensinam desde o berço e que deu no que deu. Cá para mim, prefiro o meu ridículo.
Adrilles Jorge