Amor Eterno Amor

"Amor Eterno Amor" parece peça de propaganda místico-religiosa

Mauricio Stycer

Mauricio Stycer

Crítico do UOL

Da forma como a Globo apresentou “Amor Eterno Amor” em repetidas publicidades antes da estreia, o tema principal da novela de Elizabeth Jhin parecia dos mais batidos: a procura de uma mãe pelo filho desaparecido 30 anos antes e o sonho deste mesmo rapaz em reencontrar a menina a quem jurou amor eterno quando tinham sete anos.

Mas havia outro tema, deixado em segundo plano pela publicidade, que se revela agora, depois de quatro capítulos, tão ou mais importante que o velho clichê dos encontros e desencontros das pessoas queridas. Trata-se das chamadas “crianças índigo”.

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Sem embasamento científico, mas respaldo na parapsicologia e no espiritismo, “crianças índigo” são consideras especiais, com dons intangíveis, sensíveis, intuitivas, visionárias.

A autora de “Amor Eterno Amor” apresentou uma verdadeira salada mística nesta primeira semana da novela. No prólogo, Elizabeth Jhin fez recitar: “Será fácil reconhecê-los. Palavras não serão necessárias, nem mesmo será preciso saber seus verdadeiros nomes. Saberá encontrá-los pela afinidade de suas energias, pelo chamado de seus corações e pela profunda identificação com os seus sentimentos”.

Ainda no capítulo de estreia, um espírito, Lexor (Othon Bastos), apareceu de roupa branca sob luz brilhante para abençoar o “casamento” das crianças Carlos e Elisa.

O garoto, na verdade Rodrigo, desapareceu aos três anos no Rio de Janeiro, foi criado em Minas por uma mulher bondosa e um padrasto cruel, e fugiu para Marajó, onde cresceu e vive até hoje.  

Carlos-Rodrigo, vivido por Gabriel Braga Nunes, tem um dom desde criança. Conversa com animais. Não prende o cavalo. “Falei para ele esperar quieto, ele vai esperar”. Acalma um búfalo indomável. Pede para a onça deixá-lo a sós com um amigo e é atendido.

No Rio, sua mãe, Verbena (Ana Lucia Torre), ainda sonha encontrá-lo. A menina Clara (Klara Castanho), filha do médico Gabriel (Felipe Camargo), que cuida de Verbena, também tem dons especiais. Ela “vê” pessoas e situações e acredita que Rodrigo vai encontrar a mãe.

Já no segundo capítulo, a jornalista Mirim (Letícia Persiles), irmã de Clara, propõe fazer uma reportagem sobre “crianças índigo”. “Acho muito importante trazer essa discussão ao grande público”, ela diz à editora Laura (Giulia Gam).

Na fala seguinte, Elizabeth Jhin se entrega: “Pode ficar tranqüila porque não vou levantar bandeira nenhuma. Minha pretensão aqui é fazer com que as pessoas reflitam sobre este momento que a gente está vivendo, que a humanidade está vivendo”, diz Miriam à editora.

No quarto capítulo, Verbena dá outra lição mística à irmã, a malévola Melissa (Cássia Kis Magro): “Morrer com mágoas é péssimo. A gente sempre precisa voltar para resolver o que ficou para trás”.

Toda novela apresenta, de alguma forma, a visão de mundo de seu autor – um arco muito amplo, que inclui valores, princípios e ideias sobre a realidade, capazes de serem compreendidos pelo maior universo de pessoas.

Fé e religião fazem parte dos valores de cada um. Personagens têm religião, e suas crenças devem ser respeitadas, mas não são um bom assunto para proselitismo em novela.

Até o momento, pelo sua insistência no tema e pela forma como está sendo abordado, “Amor Eterno Amor” parece uma peça de propaganda místico-religiosa. Para quem tem crenças diferentes ou, simplesmente, não crê em nada, a novela chega a ser incômoda, muito pouco convidativa.

Mauricio Stycer

É jornalista desde 1986. Repórter e crítico do UOL, autor de um blog que trata da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor. Conheça seu Blog no UOL

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