Como Tatá, veteranos recorrem a fonoaudiólogos para compor personagens
Amanda Serra
Do UOL, em São Paulo
Com experiência no humor, que tem como característica a fala rápida, a carioca Tatá Werneck tem sofrido críticas por conta de sua dicção na novela "I Love Paraisópolis", que começou dia 11 de maio. Algumas frases ditas por Danda, moradora da comunidade Paraisópolis, em São Paulo, soam incompreensíveis para o público.
Para doutora em linguística e fonoaudióloga Claudia Cotes, a novela pede uma forma de falar diferente daquela da comédia, já que envolve interpretação e diálogo. Entre as mudanças sugeridas pela profissional, está colocar ênfase nos sons marcando mais as palavras (veja os comentários e dicas da fonoaudióloga no vídeo acima). Ciente do problema, a direção da Globo já escalou um fonoaudiólogo para aprimorar a dicção da atriz, conforme informação do colunista do UOL Flávio Ricco. Em seu Twitter, a atriz afirmou que faz aulas de fonoaudiologia há cerca de dois meses.
"Fazer o outro rir, chorar, pensar, não importa. Voz é emoção. Som é sentimento. Os novos talentos são vozes sociais. Por isso, têm responsabilidades. A primeira é dar o som perfeito para o ouvinte, em sinal de respeito. A dedicação de um artista é retribuída de três formas: riso, choro e aplausos", complementa a especialista.
Como Tatá e outros colegas de profissão, o ator Mauro Mendonça, hoje com 84 anos, precisou de ajuda profissional por conta da entonação baixa e de seu jeito tímido para compor seus primeiros personagens. "Tinha a voz muito para dentro, mineiro, tímido... Mas adquiri uma escala vocal que não imaginava que tinha com a ajuda de uma professora. Teve um tempo que só falava de um jeito. É importantíssimo o trabalho vocal para o ator", disse em entrevista ao UOL.
Vítima de depressão na década de 70, Mauro buscou a ajuda da fonoaudióloga dos artistas Glorinha Beuttenmüller, responsável por treinar os jornalistas Sérgio Chapelin, William Bonner, Fátima Bernardes, Ana Paula Padrão, Carlos Nascimento e a atriz Irene Ravache. "Nunca deixei de fazer uma peça, uma novela sem a ajuda dela. Ela teve uma paciência enorme comigo, porque eu estava muito deprimido, a voz não saía. Na primeira aula, ela falou: 'Você dorme mal e acorda pior ainda'. Era exatamente isso, achava ela uma bruxa. Fazia exercícios para soltar a voz, imitava vilões", contou o ator, que recebeu a indicação da amiga e atriz Fernanda Montenegro.
Para atriz veterana Vera Holtz, ter o auxílio de um fonoaudiólogo contribui para o artista organizar suas escolhas durante o processo criativo. "Você passa a conhecer seu delicado e fundamental instrumento de trabalho, a voz, e aprende a usá-lo corretamente para não machucar suas cordas vocais. Além disso, percebe sua extensão vocal, a emissão das palavras, articulação, projeção e corrige problemas em seu aparelho fonador. Recentemente, tive uma preparadora no Rio e aprendi muito com ela. Organizar vocalmente as cenas que ia criando, economizar a voz em determinadas momentos. Usar diferentes regiões para poupá-la", explicou Vera.
Quando encarnou a vilã Violeta de "Três Irmãs" (2009), Vera precisou atenuar seu sotaque de Tatuí, interior de São Paulo, para encarnar a rica que vivia em uma cidade praiana do Rio de Janeiro. "Quando fiz a vilã atenuamos os 'erres' e não foi difícil, pois contava com os cuidados de um continuísta, que atentamente me alertava quando eles teimavam em aparecer", contou a atriz.
Sotaques: ter ou não?
Com 32 anos de carreira, a atriz afirma que a adaptação ou não dos diversos sotaques brasileiros varia de acordo com a temática da obra e do perfil do papel. "Ele [sotaque] é uma riqueza desta terra estranha e diversa. Dependendo da personagem é necessário [adaptar] e contamos com profissionais competentes nessa área para nos ajudar", disse. Ela ainda contou ter mais facilidades com a pronúncia do sul – "Tenho uma vivência maior".
Na estrada há 61 anos, Mauro diz ter um "sotaque teatral" e acredita que é obrigação do artista se adaptar a pronúncia de acordo com os projetos. "Isso é o trabalho de cada um. No teatro, por exemplo, você precisa ser claro e falar ao centro. É necessário envolver todos. Depois de algumas pesquisas, viram que as falas corretas para o teatro são a carioca e a paulista, claro, sem os vícios", disse.
Ele também se mostrou avesso à unificação das falas nos folhetins. "Lamento muito que a TV Globo esteja uniformizando a maneira de falar. Os sotaques regionais são lindos, mas quase não existem mais. Agora, existe o antes e o depois da fala com a TV Globo".
"Os iniciantes já sabem da necessidade de ter bons profissionais ao lado deles, pois a maioria vem de cursos especializados e é sempre bom continuar ouvindo os mais experientes", destacou Vera.
Procurada pela reportagem do UOL, a assessoria de imprensa de Tatá afirmou que a atriz não teria interesse em comentar o assunto e estaria ocupada com as gravações da novela.
Cenas de "I Love Paraisópolis"
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