Pirataria cresce mais que TV paga e setor cobra apoio do governo

Beatriz Amendola

Do UOL, em São Paulo

  • Edison Timoteo/Futura Press/Estadão Conteúdo

    Decodificadores são usados para furtar sinal de TV por assinatura

    Decodificadores são usados para furtar sinal de TV por assinatura

Os downloads de conteúdo disponibilizado de forma ilegal na web já são suficientes para deixar muitos canais e emissoras de cabelo em pé. Mas, no Brasil, o setor tem enfrentado outra forma de pirataria: o furto de sinal de TV paga. De acordo com uma pesquisa divulgada pela ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura), o país conta com 4,5 milhões de usuários clandestinos – e o mercado ilegal cresceu 8,6% entre 2014 e 2015 – bem mais do que o mercado oficial, que cresceu 6,1%.

A ABTA estima que a pirataria traga um prejuízo de quase R$ 4 bilhões para o setor, de acordo com Antônio Salles Neto, coordenador do Núcleo Anti-Fraude de TV por Assinatura da ABTA. Partindo do pressuposto que 70% dos assinantes piratas estariam dispostos a pagar por um pacote intermediário, na casa dos R$ 100, "há uma evasão de R$ 315 milhões por mês. Ao ano, R$ 3,8 bilhões", disse ele à reportagem do UOL.

Apesar dos números, o mercado ilegal cresceu bem menos do que entre 2013 e 2014, de acordo com Salles Neto – nesse período, porém, a entidade ainda não possuía uma metodologia de pesquisa estruturada, como a deste ano. "Em 2013-2014, nós estimávamos que o mercado ilegal havia crescido 20%, e o oficial, pouco mais de 10%", afirmou. Para ele, a diminuição entre os dois períodos se deve a medidas tomadas pelo setor, incluindo melhorias na tecnologia de segurança.

Um agravante do cenário, acredita Salles Neto, é o fato de o Brasil não ter nenhuma lei específica para punir o furto do sinal. "O parlamento está trabalhando em uma modificação do código penal, modificação de algumas outras leis, para que o furto seja tipificado. Existe uma sensação de impunidade". Atualmente, tramita no congresso o projeto de lei 239/2007, que tipifica o furto de energia eletromagnética, onde se encaixaria o furto do sinal.

Nos esforços de conter a pirataria, o setor da TV paga tem buscado medidas legais, além do aprimoramento da tecnologia. "Quando detectamos alguma movimentação, nós encaminhamos para advogados, que encaminham para o Ministério Público. Mas há uma fraqueza, já que o poder público não tem grandes recursos jurídicos. Então os advogados e a policia usam outros artigos [da lei], como evasão de divisas, fraudes fiscais", explicou Salles Neto, acrescentando que o setor também entrou com uma ação civil pública para proibir a venda de decodificadores usados para interceptação de sinal. A ação foi bem sucedida, mas esses produtos persistem no mercado do contrabando.

Preço
De acordo com pesquisa feita pela Ancine, 51% da população que não assina TV paga cita o preço como o principal impedimento. E a pesquisa da ABTA mostra que a maior parte dos usuários clandestinos está nas classes D/E (19%) e C (13%) – as classes A e B respondem por 7% cada entre eles.

Mas o coordenador discorda de que os valores do pacote levem à pirataria. "Quando você olha o preço da TV paga no Brasil, ela é a trigésima em uma lista mundial. Ainda mais agora, com a desvalorização da moeda, o preço não é um preço muito elevado, tendo em vista o resto do mundo", afirmou. Em sua opinião, o problema é comportamental: "Há pirataria na classe A. Qual a explicação? Gente que tem barco não quer pagar uma assinatura. É uma questão comportamental que é difícil explicar".

Executivos cobram medidas
A pirataria foi muito discutida por executivos durante o congresso da ABTA, que terminou na quinta-feira (6). Fernando Medin, do Discovery na América Latina, disse em um painel que a questão é mais urgente do que a possível regulamentação do Netflix, também cobrada pelo setor.

"Podemos debater qual é o número do Netflix, mas o número de piratas está em torno dos cinco milhões", afirmou. "É um número que está se calcificando e isso é muito sério. Acho que deveríamos direcionar nossos esforços para isso. A pirataria mata a cadeia de valor e passa esse dinheiro para os bandidos. É um assunto inadiável. A lei já estamos cumprindo, vamos nos focar nessa outra parte que vai gerar renda e impostos".

Para Márcio Carvalho, da NET, o papel do governo também é importante para enfrentar esse problema. "A gente não consegue reagir sozinho, precisa de governo. A gente segue conversando muito sobre o assunto, buscando ser mais efetivos, porque afeta o país, afeta a sociedade. É um caso de polícia e de cultura, temos que trabalhar nessas duas frentes".

No que se refere ao fator cultural, é importante informar melhor a sociedade a respeito do que é o furto de sinal, ressaltou Flávia Hecksher, da Globosat. "Tem muito consumidor que nem sabe exatamente que está no mundo da pirataria. Começa com um trabalho das instituições de mostrar o que é pirataria. Sem dúvida, a oferta de bom conteúdo vai melhorar a pirataria, mas não vai acabar com ela".

O problema da interceptação de sinal, porém, não é a única forma de pirataria na TV paga. Também é um desafio lidar com pessoas que assinam o pacote, mas dividem os pontos adicionais entre outros domicílios, o que não é permitido. "Na Oi, a gente tem tomado cuidado com as ofertas que a gente coloca", disse Bernardo Winik, da Oi TV. "A gente audita, e acho que ainda há um trabalho a ser feito, a gente sabe que é algo que existe. Outro dia recebi uma ligação, falando 'você pode dividir com o vizinho, com a casa de cima, de baixo'. Nesse tipo de pirataria, a gente tem como agir de uma forma mais efetiva."

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