Para filho de Pablo Escobar, série de TV glamouriza vida do traficante
Giselle de Almeida
Do UOL, no Rio
-
EFE
Juan Pablo Escobar lança a sua versão sobre a vida do pai, morto em 1993
Há 21 anos, Juan Pablo Escobar foi a última pessoa a falar com seu pai, o temido traficante colombiano Pablo Escobar, morto ao ser capturado pela polícia num telhado em Medellín.
Somente agora ele se sente mais ou menos seguro para contar com suas próprias palavras a trajetória do "melhor pai e o pior bandido do século passado". Segundo ele, o livro "Pablo Escobar, Meu Pai" é sua forma de deixar um registro mais preciso para as vítimas, para seu filho, Juan Emilio, 2, e de oferecer uma visão mais realista do homem retratado em grandes produções como a série de TV "Pablo Escobar, o Senhor do Tráfico", exibida no Brasil pelo canal +Globosat.
"A série é ruim porque não respeita a história do país e a insulta. Construiu um personagem que está muito longe de ser um verdadeiro. E o pior de tudo é que acaba inspirando os jovens para o mal, faz com que eles acreditem que o mundo do narcotráfico é cheio de glamour, de festas, de comodidades. É o contrário. Quanto mais dinheiro tínhamos, mais pobres nos sentíamos e mais sentíamos falta de liberdade. Quando você tem essa experiência tão de perto, está morrendo de fome com milhões de dólares em dinheiro vivo ao lado, você percebe que o narcotráfico não é tão bom negócio quanto pintam", analisa o arquiteto e desenhista industrial de 38 anos, que hoje vive com sua família em Buenos Aires, em entrevista ao UOL.
Querem continuar tomando posse de uma história que não é deles e contando a versão que convém a eles e não a que vivemos de verdade, como país e como família.
As críticas sobram também para outras obras literárias sobre seu pai, que ele diz serem cheias de falhas ou com interesses ocultos, como a biografia escrita por seu tio Roberto, informante da DEA, divisão antidrogas americana. "Tudo que se quiser inventar sobre ele se encaixa perfeitamente. Mas é uma história que não precisa de pimenta, porque já tem bastante", diz.
Em sua versão dos fatos, além de contar suas memórias, Juan Pablo conversou com vizinhos, amigos e ex-sócios do pai, numa rara visita a seu país, lugar que se tornou perigoso para toda a família após a morte de Escobar, em dezembro de 1993. "Encontramos uma grande disposição das pessoas a contar a verdade e só uma pessoa não quis ajudar como devia. Mas acho que cobrimos 99% da vida do meu pai e sua responsabilidade nos atos violentos na história da Colômbia", conta ele, que recebeu outro aviso para não retornar.
Embora legalmente se chame Juan Sebastían Marroquín Santos, é com o nome de batismo que Juan Pablo assina o livro, em que afirma, por exemplo, que Frank Sinatra foi sim um contato do narcotráfico colombiano nos Estados Unidos. "Era um mito no começo, então investiguei com profundidade. Me confirmaram que não era meu pai que lidava com ele diretamente, mas um sócio antigo, muito amigo dele", declara.
Apesar de ter descoberto muitas histórias ao longo da pesquisa, o escritor conta que não se surpreendeu com os relatos, por estar acostumado às histórias violentas que rondavam seu pai desde pequeno. Nem passou a vê-lo com outros olhos, já que o traficante nunca escondeu a verdade de sua família. Em sua infância, Juan Pablo teve poucos amigos e teve alguns dos mais perigosos bandidos do país como babás. "Ele nunca nos quis fazer acreditar que era outra pessoa, que estava sendo perseguido ou vítima de alguma injustiça. Meu amor por ele nunca diminuiu, apesar de os nossos problemas terem sido consequências de seus atos", afirma.
A dualidade também expressa o que o povo colombiano sente sobre o líder do Cartel de Medellín. Segundo Juan Pablo, a vítima de um atentado terrorista certamente terá uma imagem diferente de famílias humildes que foram "beneficiadas" pelo traficante, como pessoas que ganhavam táxis de presente para manter o patrão informado de tudo que acontecia na cidade. "Ele construía quadras de futebol financiadas com dinheiro da droga. É muito contraditório, mas foi assim que aconteceu", lembra Juan Pablo.
O autor defende que o pai quis ser encontrado pela polícia no dia de sua morte, já que violou sua regra de ouro ao usar o telefone para se comunicar com a mulher e os filhos, e que se matou antes de ser pego. "Ele sabia que sua família era refém do estado colombiano e que, se não aparecesse morto, seríamos nós. Foi o maior ato de amor que poderia ver num ser humano. Ele literalmente deu a vida por sua família", afirma.
Além de dar palestras em empresas e universidades, o escritor tem uma marca de roupas com estampas da imagem do pai, mas se defende de críticas de apologia ao crime ao afirmar que os produtos trazem mensagens de paz. "O que fazemos é atrair os jovens com a imagem dele e damos uma mensagem que os faça refletir, que os inspire a não repetir a história do meu pai. Muitas mães nos escrevem agradecendo. Fui a primeira pessoa no mundo que tive a oportunidade de virar 'Pablo Escobar 2.0', mas fui a primeira pessoa a dizer não a essa opção", constata.
Veja também
- Série "True Detective" volta com cadáver sem olhos e heroína feminista
- Astro de Demolidor fez questão de cenas de luta: "É só tentar não apanhar"
-
- Quinta temporada de "Game of Thrones" tem final sangrento
- Papel de Red em "Orange Is the New Black" aos 60 é "libertador", diz atriz
- "Quis preservar a arte do cinema na série", diz diretor de "True Detective"