Carlos Alberto de Nóbrega comemora 25 anos de "Praça" de olho no ibope e em possível sucessor

Amanda Serra

Do UOL, em São Paulo

Vinte e cinco anos e 1.217 edições depois de estrear “A Praça É Nossa” no SBT, em 7 de maio de 1987, o humorista Carlos Alberto de Nóbrega parecia mais preocupado do que radiante com a proximidade do aniversário do programa, quando recebeu o UOL, na última sexta-feira (4), em sua casa, em Alphaville, na Grande São Paulo.

Um dia antes, encarara – sem Ronald Golias, seu favorito dentre os colegas que já passaram por aquele banco – a sua última batalha contra o “Rei Davi” da TV Record, de quem vinha apanhando no ibope nos últimos três meses.

“Audiência é algo que me incomoda doentiamente, muito! O importante é ganhar, e não competir. Me incomoda perder, sofro. Quinta-feira [exibição da ‘Praça’] é o dia em que mais fico nervoso”, admite Nóbrega, que aos 76 anos ainda é responsável por apresentar, comandar e roteirizar boa parte do programa, ao lado dos redatores Magalhães Júnior e Sérgio Valezin, além do próprio filho, Marcelo da Nóbrega, que dirige a atração.

Está na hora de o SBT jogar uma bomba no ar! Não dá para fazer nada sem dinheiro. A Band está colando na gente e está incomodando. Está na hora de trazer alguém e mostrar que existimos

“Combinei com o Marcelo que não quero mais saber da audiência no dia, pois se eu souber que deu 7 pontos [no Ibope] não tem Lexotan [calmante] que me faça dormir. Nove pontos é o número bom para mim”, afirma. Para comparação, dez pontos no Ibope foi a média obtida pelo “Pânico” em seu primeiro mês na TV Bandeirantes, comemorada como recorde recente pelo canal. Cada ponto no Ibope equivale a 60 mil domicílios na Grande São Paulo com o televisor sintonizado em um programa.

“Está na hora de o SBT jogar uma bomba no ar! Não dá para fazer nada sem dinheiro. A Band está colando na gente e está incomodando. Está na hora de trazer alguém, dar uma mexida e mostrar que existimos”, protesta o apresentador, que há tempos tentou levar Tom Cavalcante para o SBT, mas não conseguiu abrir o cofre do patrão.

“O SBT está acomodado, com medo da situação financeira. Se a Band vendeu o horário para os religiosos (R.R Soares), se o dinheiro vem do céu, vamos vender também! A Record tem o dinheiro que Deus manda lá de cima. Vamos pedir a Deus um pouquinho pra gente [SBT], porque senão eles vão dar para Bandeirantes, para Gazeta... Me sinto frustrado por não poder fazer coisa melhor”, desabafa.

Procura-se talentos
Enquanto “Deus” ou Silvio Santos não ajudam, Nóbrega segue apostando no que vem fazendo nesses últimos 25 anos, período em que ajudou a descobrir, criar ou prestigiar os mais de 150 personagens que diz terem passado pelo humorístico do SBT – alguns reciclados de “A Praça da Alegria”, programa precursor, lançado pelo pai, Manoel da Nóbrega, 30 anos antes do seu, na TV Paulista.

“É gratificante descobrir os talentos. É como tirar um bebê da maternidade e vê-lo crescer, assim como aconteceu com o Marcelo Médici, que o Marcelo [Nóbrega] descobriu às 3h da madrugada fuçando na TV a cabo”, conta, citando também os atores Mauricio Manfrini (Paulinho Gogô) e Giovani Braz (Bêbado) como boas descobertas. “Sinto ciúmes dos meus meninos. Essa geração tem um valor extraordinário, pois está substituindo gente de peso, como Vera Verão, Velha Surda, Golias”, enumera.

MEMÓRIAS DE CARLOS ALBERTO DE NÓBREGA

O quadro de um homem sentado no banco de uma praça lendo jornal ilustra uma parte da vida do humorista Carlos Alberto mostra o roteiro da "Praça", o qual ele se envolve pelo menos 90% há um quarto de século Porta-retrato que ganhou de Silvio Santos. Na foto Manoel de Nóbrega, Silvio e Carlos Alberto de Nóbrega

Classificando o tipo de humor da “Praça” como “inocente” e com “piadas da cintura para baixo”, Nóbrega diz se aborrecer com as pessoas que preferem descrever sua comédia como arcaica. “Chamam a gente de velho, de mofo, e acho isso um desrespeito, talvez pela minha idade. O humor só precisa ter graça e o público ri com a ‘Praça’,” defende.

Na tentativa de fazer rir – e de se manter relevante frente a um novo público -, Nóbrega diz que pode tentar de tudo, só não admite “fazer piadas sobre religião, homossexualismo, cor”. “O limite do humor é o ridículo. Cortar o cabelo de uma assistente de palco é o limite, agora colocar ela arrotando ao vivo é ridículo, agressivo”, define.

Seguindo os passos de Silvio Santos, que recentemente virou assunto mais comentado na internet por conta do novo visual grisalho, o humorista contou que andou pensando até em ficar careca. “Quase raspei meu cabelo para comemorar os 25 anos da 'Praça'. Todo mundo iria comentar o programa por pelo menos três meses, até o meu cabelo crescer. Mas meus filhos me convenceram a esquecer essa ideia.”

Um dia a 'Praça' vai acabar. Seja com a minha morte, por falta de comediantes, ou por uma decisão da emissora e do público. E eu não estou preparado para isso. O Marcelo nunca vai sentar no banco da 'Praça'. Isso seria desejar um mal para o meu filho. É um peso muito grande, que não gostaria que ele carregasse, pois a comparação é inevitável

O fim, o início e o meio
Alternando momentos de esperança com outros de clara melancolia, Nóbrega garante que nunca pensou em desistir do programa, apesar de saber que ele chegará ao fim. “Um dia a 'Praça' vai acabar. Seja com a minha morte, por falta de comediantes, ou por uma decisão da emissora e do público. E eu não estou preparado para isso. O Marcelo [Nóbrega, diretor da atração] nunca vai sentar no banco da 'Praça'. Isso seria desejar um mal para o meu filho. É um peso muito grande, que não gostaria que ele carregasse, pois a comparação é inevitável”, sustenta, retomando um conselho que recebeu de Boni, quando cogitou substituir o pai na “Praça da Alegria”, ainda na TV Globo, em 1977, mas foi preterido por Luís Carlos Miele. “Morria de ciúmes, pois achava que aquele lugar era meu.”

Espírita, Nóbrega diz que só decidiu tomar a dianteira do programa depois de uma conversa com Augusto César Vanucci, então diretor artístico da Globo, que estava de saída para a Bandeirantes e dizia ter um “recado” de Manoel da Nóbrega: “Ele quer que você volte a fazer a Praça”, teria dito Vanucci. “Pedi para o Augusto deixar meu pai em paz, mas depois de um tempo ele voltou a falar sobre o assunto e avisou que ia assumir a direção de arte da Band e que gostaria de exibir a ‘Praça’”, lembra.

“Antes de ir para Bandeirantes, em 12 de dezembro de 1986, ofereci a ‘Praça’ para o Silvio [Santos], era aniversário dele. Ele arrumou várias desculpas e disse que não era um bom momento. Quando a ‘Praça Brasil’ foi ao ar, o Silvio me ligou e disse que queria que eu fosse para o SBT. Fazia dois meses que tinha assinado com a Band e não podia sair. Ele pagou a multa e aí a ‘Praça’ estourou”, diz.

  • "O SBT está acomodado, com medo da situação financeira. Se a Band vendeu o horário para os religiosos (R.R Soares), se o dinheiro vem do céu, vamos vender também! A Record tem o dinheiro que Deus manda lá de cima. Vamos pedir a Deus um pouquinho pra gente [SBT], porque senão eles vão dar para Bandeirantes, para Gazeta... Me sinto frustrado por não poder fazer coisa melhor”

Depois de um quarto de século no ar, Nóbrega descreve a praça como tendo “uma importância mística” para ele. “É uma criação do meu pai, e não minha. Estou aqui cumprindo uma missão. Enquanto a ‘Praça’ estiver no ar, o meu pai estará vivo”, acredita. E, apesar de dizer que não deseja que o filho Marcelo se sente no banco após sua morte, abre uma exceção quando fala do filho caçula. “Daqui uns 20 anos acredito que o João Victor assumirá meu lugar. Temos uma ligação muito forte e acredito que ele é a reencarnação do meu pai. Mas isso é uma viagem minha”, especula.

Veja a seguir outros momentos da conversa de Carlos Alberto da Nóbrega com o UOL:

A primeira vez
“O dia 7 de maio de 1987, estreia da ‘Praça É Nossa’ no SBT, foi o dia de maior alegria artística para mim. O Carlos Imperial abriu os direitos da música ‘Praça’ e, no fim do quadro, o Silvio Santos entrou no estúdio, pela primeira e única vez em que ele participou de uma atração que não era dele. Durante uma hora e meia, o Silvio falou sobre a relação da minha família com ele, me chamou de irmão. Foi a maior declaração de amor, respeito, carinho e gratidão que uma pessoa poderia ter. Ele se despiu!”

Silvio Santos
“O Silvio cumpriu e cumpre com tudo que ele me prometeu. Nunca me disse um não. Sou muito mais bem tratado no SBT do que em casa.”
“Já faz 36 anos que brigamos, e hoje é um assunto encerrado, nos respeitamos. Quando quero falar com ele, mando um bilhete, pois ele prefere que você escreva ao invés de falar. Mas sinto saudade do amigo que eu tinha. Passeávamos de barco, esquiávamos, viajávamos. Sinto falta de falar sobre a vida, tenho muitos amigos, mas não um para conversar, ir ao cinema. O mundo mudou e está cada um em seu casulo agora.”

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Despedidas
“O Golias sem dúvida é o personagem mais marcante do programa, não apareceu outro. Ele era um ser humano incrível. O Golias era espontâneo, engraçado, dava vida aos textos. O Golias e o Mussum eram exatamente iguais, na vida real, àquilo que aparecia na TV. Os dois momentos mais tristes que vivi foram: quando soube que ele [Golias] não voltaria mais a gravar e quando ele morreu.”

“É horrível ver os humoristas antigos indo embora. Sei que em breve terei que enfrentar mais duas mortes - Jorge Loredo (Zé Bonitinho) e Canarinho (Aluísio Ferreira Gomes). Só sobraram o Moacyr Franco, o Clayton Silva, que está doente, e eu.”

Inspirações
“Minhas inspirações estão no cotidiano. O Professor Bartolomeu foi inspirado no meu avô, o Bronco no motorista do meu pai [ambos personagens vividos por Golias], o Lafon [Jorge] era figurante dos ‘Trapalhões’ e a própria pessoa dele me trouxe inspiração para criar a Vera Verão.”

“Os personagens são da vida e esse é o grande segredo. As atrações que duram são aqueles que não são mentirosos, como o ‘Ô Coitado.’ Já tentei voltar a fazer o quadro da fofoqueira, mas não dá certo. Não encontro artistas para viver esse papel e nem os que foram interpretados pelo Golias.”

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