"Não sou um apresentador e não quero construir carreira em TV", diz Gentili
Amanda SerraDo UOL, em São Paulo
Com o olhar de um fã, como o próprio define, Danilo Gentili rejeita o título de apresentador, mostra saber para onde está indo, apesar da insegurança, e afirma que não quer ficar na televisão apenas por ficar. Com cerca de 50 episódios no ar, o jovem comediante vê seu programa "The Noite", no SBT, como um espaço para o convidado se desfazer de uma imagem predefinida e não se levar tão a sério.
"Não sou apresentador de talk show, sou um fã do formato fazendo coisas de fã. Não quero ter carreira em TV, quero fazer o que eu gosto. Meu medo é ficar na TV fazendo coisas que eu não gosto, entregar um programa que não acredito, que as pessoas não aprovem. Não quero ser carreirista de TV, assim como saí da igreja porque não queria ser carreirista de igreja", afirma Danilo em entrevista exclusiva ao UOL.
Aos 34 anos, Gentili já foi funcionário público em Santo André (SP), onde nasceu, por pouco não se tornou pastor da igreja evangélica Batista, da qual era membro, e viu sua vida mudar nos palcos de stand up comedy. Com ideias preestabelecidas do que quer, Danilo faz analogias entre o mundo da TV e o da igreja.
"Sou um monoteísta freelancer. Pensei em ser pastor, porque sentia vontade de cuidar das pessoas da igreja, fazer as coisas funcionarem, mas ao mesmo tempo olhando alguns pastores pensava: 'Pô, depois eu chego à idade desse pastor e será apenas uma profissão'. Via que era meio automático e para preservar minha fé preferi não ser um profissional da fé. Às vezes a igreja acaba sendo automática, e não o que tem que ser", define o comediante, que diz acreditar em Deus. "Sou cristão, minha fé continua a mesma."
Seguidor do humor autodepreciativo, Danilo adotou uma técnica que ele define como "catequização do entrevistado" – antigamente, para atrair convidados para sua atração, o comediante explicava para o entrevistado que o público tendia a gostar mais dele quando o via rindo de si mesmo. "Escrevia piadas e dava para o entrevistado me zoar. No meu processo de catequização de humor autodepreciativo, a primeira pessoa que sofreu com as minhas piadas fui eu mesmo".
"No Brasil as pessoas se levam muito a sério, mas nosso programa tem quebrado isso. Vejo as pessoas aceitando se desconstruir somente aqui ["The Noite"], aceitando a auto piada. A Ana Paula Padrão, por exemplo, nunca a vi falando do jeito que ela falou aqui em outro lugar. A pessoa vem aqui com o seguinte intuito – 'O lugar de me desconstruir é indo lá'. Doutrinamos o público e os convidados que o 'The Noite' é o lugar para relaxar e não se levar a sério. Desconstruímos o que era a Sandy quando ela foi no 'Agora é Tarde', assim como fizemos com o Anderson Silva", acredita Danilo.
"Não sou um apresentador de TV"
Apesar dos números positivos no Ibope e de muitas vezes ficar à frente do "Programa do Jô", da Rede Globo, Danilo prefere manter os pés no chão e enxergar a carreira como uma "fatalidade que deu certo", mas que pode acabar a qualquer momento. Ou talvez seja só conversa de um visionário, tentando conquistar mais seguidores e confetes.
"Sou um cara fatalista, parto do princípio que dará errado. Fui para o SBT com medo de dar errado. Nunca quis ter outro programa, queria fazer isso. Acho que amanhã tudo acaba para mim", revela Gentili, que recebeu propostas de outras emissoras e do próprio Sistema Brasileiro de Televisão para conduzir outros formatos e rejeitou.
"É muito mais fácil dizer mil fatores pelo qual posso sumir amanhã do que motivos pelos quais ficaria no lugar de um Jô Soares ou de um Carlos Alberto de Nóbrega, que tem 60 anos de carreira", completa ele, que assume ter limitação para conduzir outro tipo de atração. "Não sou um apresentador de TV, contratado para apresentar algo com regras específicas. Não teria competência para fazer isso. Só sei apresentar uma coisa que idealizei", diz ele, com um discurso que pode aparentar uma certa demagogia.
Com carta branca da direção do SBT, Danilo vai traçando seu caminho, e diz não se preocupar com Ibope. "Não me preocupo com audiência. A televisão brasileira entrou em buraco fundo porque todos os programas pensam em audiência. E pensam errado. Aí, começam as 'cagações' de regras. 'O que dá audiência?'. 'Mulher pelada'. Aí botam cinco peladas no palco. 'Comer barata dá audiência?'. Aí colocam também. De repente você começa a ver umas aberrações".
À frente do "Agora é Tarde" por três anos, com um salário bruto de R$ 90 mil, conforme o UOL apurou, Danilo migrou para o SBT e viu o cachê mudar, fora o valor que recebe de publicidade. Entretanto, Gentili foge de perguntas sobre sua vida financeira e afirma que "nunca negociou valores para si".
"Minha hora agora é de plantar. O SBT apostou muito alto em mim, mas não em relação a dinheiro, e sim, na questão de disponibilizarem uma grade horária e da carta branca que deram para eu criar. Só negociei os salários da minha equipe de bastidores. Na real, faria de graça esse programa nas condições que tive. Estou na fase de construir e não de passar no caixa e pegar meu dinheiro".
Questionado se assistiu a estreia de Rafinha Bastos no "Agora é Tarde", Danilo afirma que sim, mas conta que não conversou com o sócio do bar Comedians. "Chamo o programa de extinto 'Agora é Tarde'. Não existe mais o programa, aliás, acho que virou outra coisa. Não parece nenhum talk show. Não estou dizendo que é ruim, mas como gênero para mim, não é um talk show. Acho que nem eles estão gostando do programa, porque estão me processando e me obrigando a voltar para apresentá-lo" [risos]", finaliza o humorista, que acumula cerca de 12 processos no currículo.