Há um mês no JN, Maju aprova informalidade: "Tira o ar de donos da verdade"
Beatriz Amendola
Do UOL, em São Paulo
Nova garota do tempo do "Jornal Nacional", Maria Júlia Coutinho – ou simplesmente Maju – tem se destacado no periódico. A primeira jornalista negra da Globo na função corrigiu o âncora William Bonner quando ele perguntou a ela se o tempo estaria "bom", e ainda passou a ser chamada de Maju por ele no ar, surpreendendo muitos espectadores.
Maju estreou na função de moça do tempo no "Bom Dia São Paulo" e "Bom Dia Brasil", durante a licença maternidade da colega Eliana Marques. E nesta quarta-feira (27), ela completa um mês no "JN", satisfeita por poder informar com um pouco de informalidade – uma marca da nova versão do jornalístico. "Acho que tenho conseguido colocar em prática aquilo que sempre acreditei: informar usando uma linguagem mais coloquial. Creio que estou conseguindo usar a informalidade, sem abusar dela. A maior parte do retorno que recebo é positiva", contou em entrevista por e-mail ao UOL.
O caminho mais informal seguido pelo "Jornal Nacional", que agora deixou os âncoras William Bonner e Renata Vasconcellos mais soltos e com liberdade para caminhar no cenário, é aprovado por Maju, que inclui expressões como "chuvica" ao dar as notícias do tempo. "Acho que isso humaniza nossa relação com os telespectadores. Esse tipo de atitude tira aquele ar de donos da verdade, profissionais sisudos, que nunca erram, que alguns jornalistas insistem em cultivar", opinou.
Primeira moça do tempo negra na Globo
Carregar o título de "primeira moça do tempo negra da Globo" tem seu peso, mas Maria Júlia revelou que está feliz por estar sendo vista cada vez mais apenas por sua profissão – sem o rótulo que a acompanha.
Tenho sido tratada como Maria Júlia Coutinho, a Maju, a jornalista, e ponto. É assim que deve ser, pois ninguém se refere ao Bonner como o jornalista branco de cabelos grisalhos, nem à Renata [Vasconcellos] como a jornalista de cabelos castanhos e pela clara ao UOL
"É um marco importante, mas ao mesmo tempo é complicado carregar o peso de ser a primeira a fazer algo em determinado lugar", afirmou Maju. "Acho que isso ocorre porque ainda faltam representantes negros no telejornalismo. Porém, tenho ficado feliz, pois, de uns tempos para cá, minha cor tem ficado invisível na maioria das entrevistas que estou dando. Tenho sido tratada como Maria Júlia Coutinho, a Maju, a jornalista, e ponto. É assim que deve ser, pois ninguém se refere ao Bonner como o jornalista branco de cabelos grisalhos, nem à Renata [Vasconcellos] como a jornalista de cabelos castanhos e pela clara".
Vítima de alguns ataques racistas nas redes sociais desde a sua estreia no "Jornal Nacional", a jornalista não pretende tomar providências legais contra os comentaristas por enquanto. "Pelo que eu vi é uma minoria que tem feito esse tipo de ataque. Vou plagiar a pequena Carolina, de 8 anos, cujo vídeo viralizou na Internet. Quando alguém disse que ela tinha cabelo duro, Carol não titubeou e disse: 'Duro é ter que aguentar pessoa ignorante falando que meu cabelo é duro'. Cresci numa família que militou no movimento negro, tenho consciência dos meus direitos, só tomarei alguma medida quando o racismo de alguém cercear meus direitos".
Sem lembrar se já sofreu racismo no trabalho, Maju acredita que a maior presença de negros na TV "é um caminho sem volta" e que os pré-julgamentos no ambiente profissional costumam ir embora com a convivência. "Acho que algumas pessoas que só estão acostumadas a conviver com negros que ocupam cargos de seguranças, empregados, faxineiros, se assustam, e, às vezes, duvidam da capacidade de um negro que ocupa um outro tipo de função (jornalista, médico, escritor), mas esse tipo de preconceito costuma ser neutralizado com a convivência".
Tempo bom ou tempo firme?
Bem recebida pelo público, a forma mais coloquial e mais simples com que Maju fala sobre o tempo é fruto da interação dela com os seguidores em suas redes sociais, às quais recorreu para não perder o contato com os telespectadores quando deixou as reportagens na rua e assumiu o cargo de moça do tempo. "Pude testar, através da Internet, maneiras diferentes de falar sobre o tempo. Durante um ano, publiquei quase diariamente posts com a previsão do tempo usando uma linguagem mais descontraída. Usei na TV muitas das expressões aprovadas pelo público na minha rede social", disse ela, que tem mais de 8 mil seguidores no Twitter e mais de 5 mil no Instagram.
Mas a informalidade não deixa a informação menos correta. E Maju surpreendeu muitos espectadores quando corrigiu ao vivo William Bonner, ressaltando o tempo "firme" em vez do "bom". Na opinião da jornalista, a repercussão do caso "exagerada". "Não houve uma correção. A questão é a seguinte: a primeira coisa que um jornalista que vai lidar com a meteorologia aprende é que o conceito de tempo bom e tempo ruim é relativo. Pra moça que quer pegar um bronze, 'tempo bom' é sol. Pra quem precisa que o Sistema Cantareira se recupere, o tempo chuvoso é que é bom. Essa relatividade está tão internalizada em mim, que foi automático eu responder aquilo para o Bonner".
"Talvez essa ideia do tempo bom ainda estar relacionado ao tempo quente e firme tenha a ver com as coisas prazerosas que a gente costuma fazer quando não chove: ir à praia, ao parque, caminhar, andar de bicicleta", completou.
Com um posto de destaque na televisão brasileira, Maria Júlia ainda tem muitos planos para seu futuro profissional. "Vixe, tenho muitos sonhos. Não vou fechar em apenas um. O Tempo dirá o que vai rolar na minha carreira".