"O formato longo sempre adia o meu retorno para novelas", diz Selton Mello
Amanda SerraDo UOL, em São Paulo
Com um crescimento de séries nacionais na TV aberta e com a produção de novelas em formatos menores, como "Meu Pedacinho de Chão", da Globo, que termina em julho com apenas 105 capítulos, atores e diretores veem com bons olhos a nova tendência.
Há 15 anos sem participar de novelas, mas dedicado a projetos televisivos mais concisos, o ator e diretor Selton Mello, que atualmente dirige a terceira temporada de "Sessão de Terapia", no GNT, confessa que o "novelão" ainda é um dos empecilhos para sua volta aos folhetins. "Tenho vontade de voltar a fazer novelas, mas o formato longo sempre acaba adiando o desejo do retorno. Mas a vontade sempre existiu, afinal foi ali que tudo começou na minha trajetória", afirmou Selton em entrevista ao UOL.
Os atores Eduardo Moscovis, Antonio Fagundes e Juliana Paes – estes dois no ar em "Meu Pedacinho de Chão" – também já manifestaram preferência pelas tramas que demandam menos tempo. "Eu sou uma defensora das novelas mais curtas. Acho que a tão falada, temida e odiada barriga da novela às vezes acontece por conta de uma obra muito longa", opinou Juliana em entrevista ao UOL.
Fagundes disse que as novelas curtas não deixam o elenco ocioso. "Por incrível que pareça a gente gosta de ter o que fazer, de ter desafio, de ter cenas difíceis. Quando a novela é muito grande, quando tem 220 capítulos, é complicado", declarou.
"Não estou mais acostumado a fazer novelas, pelo tempo que ela demanda e pela linguagem", afirmou Moscovis afastado dos folhetins desde 2005 e atualmente no ar na série "Assuntos de Família", no GNT.
Com passagens pela Globo e pela Record, o autor Marcílio Moraes acredita que as novelas têm perdido seu prestígio para o mercado americano, responsável por produções de sucesso como "Breaking Bad", "House Of Cards" e Game of Thrones" – considerada a série mais popular da história da HBO, com mais de 18,4 milhões de telespectadores.
"Percebo que hoje em dia as pessoas só se sentem bacanas discutindo seriados estrangeiros, o que pode ser um sintoma do desprestígio das telenovelas. Os folhetins têm sido o suporte da televisão brasileira há cinco décadas. Setenta por cento do faturamento da TV Globo como um todo vêm das novelas, especialmente a das nove. A novela é um formato muito conveniente para as empresas. Seriados, em princípio, são mais caros de produzir e não asseguram um faturamento de meses como a novela. Cada temporada de 13 capítulos em média tem que lutar por seu lugar ao sol", analisou Marcílio que escreveu sua última novela, "Ribeirão do Tempo", em 2011. Atualmente ele trabalha no roteiro da série política "Plano Alto", da Record, prevista para estrear no segundo semestre.
Novos rumos
Após o lançamento das séries "Amores Roubados", "A Teia", "O Caçador", "Segunda Dama" no ano de 2014, a Globo já tem fila para o lançamento de novos seriados para 2015, como "Dupla Identidade", de Glória Perez, "Dama da Noite", de Walther Negrão e "Doutora Priscila", de Aguinaldo Silva.
"A crescente produção de séries na televisão brasileira é um sinal altamente positivo. Finalmente, parece que começamos a sair da estagnação das telenovelas que há décadas dominam nosso panorama televisivo. Um dos principais pontos da minha divergência com a direção da TV Globo, antes de sair de lá, em 2002, era exatamente a acomodação em que a emissora se encontrava de só produzir novelas. Eu propunha que se fizessem séries, que se aproveitassem os horários tardios. Lembro-me da proposta que fiz, para citar um exemplo, de um policial para ir ao ar depois da meia noite. Acharam um absurdo. Hoje, a própria Globo está produzindo inúmeras séries. Isso é muito bom. Nossa dramaturgia, os artistas e o público agradecem", analisou Marcílio Moraes.
Desde 2004, a HBO da América Latina tem investido no mercado brasileiro e ao todo já foram produzidas seis séries originais: "Mandrake", "Filhos do Carnaval", "Alice", "Mulher de Fases", "O Negócio", que terá uma segunda temporada, e "Psi".
Em busca do primeiro lugar no Ibope, a Record resolveu seguir o exemplo da Globo e investir em séries com produção brasileira, de curta duração com abordagem em temas policiais, políticos e familiares. Para 2014, estão previstos os lançamentos de "Conselho Tutelar", "Casamento Blindado" (baseada no best-seller de Renato e Cristiane Cardoso – filha de Edir Macedo) e "Plano Alto", que devem estrear no segundo semestre.
Já para 2015, está prevista a estreia da novela "Moisés - Os Dez Mandamentos" (que inicialmente seria uma série), da Record, que deverá ter 150 capítulos. A autora dos seriados bíblicos "José do Egito" e "Rei Davi", Vivian de Oliveira, gosta da mudança, já que a concisão será mantida.
"Como autora, gosto de novelas mais curtas. As histórias podem ser contadas de forma mais dinâmica, com mais reviravoltas, sem ter a necessidade da famosa 'barriga' que muitas vezes, ralenta o texto. Além disso, é menos exaustivo para toda a equipe. Escrever uma novela é um trabalho insano. São dois anos de nossa vida planejando, escrevendo e respirando praticamente só a novela", avaliou Vivian, que acredita ainda em uma mudança do mercado audiovisual.
"É bem provável que as novelas ganhem uma linguagem mais ágil. Vão passar a contar a história de outras maneiras para não perder o interesse do público, que hoje em dia, quer tudo de forma mais imediata. Se a trama não pega logo de cara, o público não tem muita paciência. Existem outras opções na concorrência", reconheceu a autora, fazendo menção aos canais fechados.
Para Selton Mello, não só autores e diretores ganham com um roteiro mais enxuto, mas o público que tem liberdade de acompanhar algo conciso, o que ajuda na hora de decidir o que assistir. "Você consegue organizar melhor a vida e se sente mais estimulado ao longo de um projeto mais curto, mantendo o prazer intacto, o brilho nos olhos do início ao fim", afirmou ele.