"Morria de vergonha de falar de sexo", diz sexóloga do "Altas Horas"

Beatriz Amendola

Do UOL, em São Paulo

Dúvidas sobre a hora certa de ter a primeira vez e outros dilemas relacionados ao sexo na adolescência podem constranger pais e educadores, mas já fazem parte da rotina da sexóloga Laura Muller. Há sete anos no "Altas Horas", da Globo, a mineira de 44 anos responde a todos os tipos de perguntas da plateia jovem do programa e conquistou o público de todas as idades com o jeito descontraído e natural de falar sobre sexo, assunto que ainda é tabu para parte significativa da sociedade.

Como fruto de sua postura animada na telinha, Laura sente na rua o carinho do público: "Sou abordada em todo e qualquer lugar. Velhinhas, gente adulta, jovens, nos lugares mais inusitados no mundo. Às vezes eu estou no banheiro de algum lugar e escuto 'Laura?' Aí eu saio pra lavar a mão e a pessoa fala 'Posso fazer uma foto? Uma perguntinha?' Eu me divirto, é um sinal de carinho do público, sinal de que a turma esta curtindo o trabalho, isso é muito importante para um sexólogo".

Reinaldo Canato/UOL
Laura Muller revelou que seu trabalho às vezes assusta os pretendentes. "Essa teoria toda que a gente estuda é só teoria, na prática é tudo ser humano, com altos e baixos, TPM. Mas a gente acaba assustando um pouco"

Apesar da tranquilidade com que Laura fala sobre sexo, ela lembra que não foi sempre assim. Jornalista de formação, ela começou a trabalhar com assuntos relacionados a sexualidade ao se tornar editora da revista "Claudia" e teve de lidar com a vergonha no início do trabalho. "Quando eu comecei a trabalhar com isso, eu morria de vergonha de falar 'pênis', 'vagina' ou entender alguma coisa. Na primeira entrevista que fui fazer, como jornalista, sobre sexo, pensei 'meu Deus, como vou perguntar tudo isso para o profissional?' E aí fui vendo que conversar de uma forma natural e descontraída e de uma forma bastante simples e principalmente natural é o jeito mais adequado de falar sobre sexualidade, porque é uma coisa positiva", contou, acrescentando que é de uma geração que não teve conversas sobre sexo com pais ou professores.

Atualmente, Laura encara com bom humor as perguntas inusitadas que os adolescentes fazem no "Altas Horas". "Os adolescentes são super criativos, cada hora eles vêm com uma pergunta. Essas perguntas acabam fazendo parte do meu universo, mas eu me divirto com o jeito único de cada um perguntar. Teve uma época que a turma encasquetou de ficar perguntando sobre esperma. E eu dava muita risada, porque perguntavam se esperma clareia o dente, se faz bem pra pele, se engrossa a voz. Mas é legal o jeitinho de cada um fazer a pergunta, bem descontraído, isso é muito bacana para a gente trabalhar".

Mas não é só sobre assuntos como ejaculação precoce, gravidez e DSTs que os adolescentes perguntam. Muitos demonstram curiosidade sobre a vida pessoal da sexóloga – e uma menina já até perguntou como havia sido a primeira vez dela. Da mesma forma descontraída com que responde outras dúvidas, Laura ressalta que não expõe a sua vida pessoal – e encoraja os jovens a fazerem o mesmo. "Algumas coisas são para ficar no privado, outras no público. A intimidade sexual da gente não é para a gente colocar no público, é algo para a gente deixar no privado, e isso deve ser preservado. A gente pode fazer um bate papo saudável sobe sexualidade, mas é preciso ver o que tem que ficar no privado e o que é pra ficar no público".

Divorciada, Laura revelou que sua profissão às vezes assusta alguns pretendentes. "Isso acontece muito não só comigo, mas com sexólogos em geral e psicólogos. Existe esse mito de que o psicólogo vai descobrir tudo o que se passa na cabeça da outra pessoa, mas não é dessa forma. Porque quando a gente vai viver as relações amorosas, sociais e familiares, é tudo homem e mulher como outro qualquer, com os mesmos erros, os mesmos acertos, as mesmas dificuldades, é tudo gente como a gente. Essa teoria toda que a gente estuda é só teoria, na prática é tudo ser humano, com altos e baixos, TPM. Mas a gente acaba assustando um pouco", contou, aos risos.

Por outro lado, o título de sexóloga não inibe alguns fãs de fazerem elogios: "A turma manda muita cantada pelas redes sociais e isso é bastante divertido. Quando eu estou na rua, percebo outra forma de aproximação, que acho muito bacana. Acabam me abordando homens e mulheres das mais variadas faixas, mas sempre de um jeito muito carinhoso, muito afetuoso, falando do programa. Esse tom de cantada é mais raro. Às vezes até escapa um comentário 'ah, está bonita, está isso, está aquilo', mas acaba entrando nesse clima mais descontraído do programa".

E os familiares e amigos, costumam tirar muitas dúvidas? "Isso é mais raro. Quando eu estou com amigos e com família, as conversas acabam sendo de outras coisas, a comida que está boa, o cachorro, e outras questões do dia a dia da gente", responde Laura. Uma das companhias constantes dela, aliás, é um cão Basset de treze anos – que, ironicamente, está sendo tratado com o princípio ativo do Viagra por conta de um problema no coração. "O Viagra, quando foi descoberto, era usado para tratamento de cardíacos. E meu cachorrinho agora está tomando isso, é muito engraçado. Até o veterinário fala 'O seu cachorro tomando Viagra é demais'", diverte-se Laura ao contar.

Reinaldo Canato/UOL
Laura Muller já jogou vôlei e trabalhou como jornalista antes de ser sexóloga

Workaholic

Natural de Juiz de Fora (MG), Laura Muller se mudou para São Paulo aos 16 anos, para jogar vôlei – esporte que praticava desde os 9 – pelo clube Pinheiros e chegou até a fazer parte da seleção paulista do esporte. Três anos depois, porém, ela foi aprovada para cursar jornalismo na Universidade Metodista, na Grande São Paulo, e deixou o esporte para seguir outro rumo: "Passei na faculdade e me encantei pelo jornalismo. E tem um detalhe: Sou alta, tenho 1,77, mas eu estava ficando baixa para jogar vôlei, em que as meninas têm 1,90m. Pensei 'acho que aqui não está muito a minha praia, vou achar outro rumo'. Sou bastante feliz hoje nesse caminho que estou trilhando".

Depois de iniciar sua carreira na "Folha de São Paulo", passar pela "Folha da Tarde" e ir para a "Cláudia", Laura investiu no mundo da sexologia, fez uma pós-graduação em Educação Sexual e cursou psicologia. Hoje, ela vive uma rotina intensa de domingo a domingo. "Eu acabo cada vez mais tendo um jogo de cintura para equilibrar consultório, gravações, os meus escritos, os estudos, a vida pessoal e as palestras. É bem corrido, é bastante coisa. Sou meio viciada em trabalho, o que não é muito saudável, então às vezes tenho que puxar o freio e dar uma paradinha", revelou a sexóloga, que gosta de relaxar aproveitando a vida cultural de São Paulo e passeando pelas cidades para as quais viaja quando dá palestras.

Laura confessou que já pensou na possibilidade de aumentar sua lista de projetos e ter um programa de televisão próprio, mas está feliz no "Altas Horas": "Já passou pela minha cabeça sim, porque é um assunto que a gente pode trabalhar de um milhão de formas, mas eu adoro trabalhar aqui, porque esse espaço que a gente tem é um espaço de contato muito rico com o jovem. Adoro o jeito que o Serginho [Groisman, apresentador] conduz, e sou muito feliz aqui, porque o que eu faço em qualquer trabalho como sexóloga eu consigo fazer aqui. Eu não trocaria o 'Altas Horas' por nada".

A sua participação no programa, aliás, foi a responsável por abrir as portas para muitos de seus outros trabalhos na área de sexologia, que ainda é alvo de alguns preconceitos. "Foi um marco na minha carreira vir para a TV. Enfrentei muito na minha carreira esse medo de alguém contratar um educador sexual pra dar uma palestra, para o jovem, o adulto ou para a terceira idade. Mas a partir do momento que botei minha carinha aqui, com o Serginho, a turma começou a ouvir que a gente pode conversar desse assunto de um jeito sem ser vulgar, de um jeito positivo, saudável. As portas se abriram até para outros sexólogos, porque a área é muito difícil. Sou muito grata", concluiu.

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