Solano, Fragoso e Antony falam ao UOL dos gays de "Amor à Vida" em gravação
James Cimino
Do UOL, no Rio
Quando não está dando vida ao altivo personagem Félix de "Amor à Vida", Mateus Solano é um homem prostrado pelo cansaço. Praticamente protagonista da trama de Walcyr Carrasco, o ator suporta a pesada rotina de gravações com a ajuda de massagens e energético. Quando termina as cenas, no entanto, os ombros se arcam, os pés se arrastam e a voz sai enfastiada.
"É assim todo dia", diz Solano (sem tirar o sorriso do rosto) à reportagem do UOL, que acompanhou com exclusividade as gravações de uma sequência de cenas entre ele e Thiago Fragoso, nesta terça (7), na Central Globo de Produção, no Rio de Janeiro.
Em um dos ensaios para uma cena em que Niko dá banho no pequeno Fabrício, Solano faz graça com o fato de seu personagem ter jogado a sobrinha em uma caçamba e começa a socar a cabeça do boneco cenográfico usado para representar o bebê.
E mesmo com o sucesso dos personagens, nem Solano nem Fragoso nem o diretor Mauro Mendonça Filho consideram o jogo ganho. No cenário da casa de Niko, discutem a intenção de cada fala, o gestual, os toques.
A grande dificuldade do brasileiro mediano, quando se trata de personagens homossexuais, é a aceitação de que existe afeto. Porque as pessoas sempre gostaram do gay cômico, mas quando é o gay amoroso, as pessoas não aceitam. O fundamentalismo antigay sempre pregou que isso 'não é Deus', mas o afeto é divino. A gente está conseguindo mudar isso somente agora e, para mim, isso aconteceu porque eles [Félix e Niko] primeiro foram amados [pelo público] antes de se amarem.
"Acho que o sucesso e a aceitação dos personagens é fruto do trabalho do Walcyr, que não colocou a emoção em primeiro plano no texto. Por não ir tão claramente direto ao assunto. Se ele colocasse com tinta forte, com palavras como 'eu te amo', talvez não tivesse mais para onde ir a essa altura da trama. A grande dificuldade do brasileiro mediano, quando se trata de personagens homossexuais, é a aceitação de que existe afeto. Porque as pessoas sempre gostaram do gay cômico, mas quando é o gay amoroso, as pessoas não aceitam. O fundamentalismo antigay sempre pregou que isso 'não é Deus', mas o afeto é divino. A gente está conseguindo mudar isso somente agora e, para mim, isso aconteceu porque eles [Félix e Niko] primeiro foram amados [pelo público] antes de se amarem", diz Mauro Mendonça Filho.
Mais disposto que o colega e tão sorridente quanto seu personagem, Thiago Fragoso também comenta como sua construção do personagem fez com que Niko se tornasse o mocinho da novela na reta final.
"Tive que tomar muitos cuidados desde o início. Queria que a humanidade dele fosse sua primeira característica, assim como sua bondade, solidariedade, compaixão, seu bom coração e a vontade de ser pai. Queria que tudo isso fosse mais forte que o fato de ele ser homossexual, justamente para que a gente pudesse trazer as pessoas para dentro desse universo e mostrar que a sexualidade faz parte do homem, mas que não nos escraviza. O que afasta uma pessoa conservadora, tradicional, é quando ela vê uma relação sexualizada entre dois homens. E o meu desejo quando comecei essa novela foi justamente trazer essas pessoas para dentro desse universo mostrando o que elas têm em comum com esses personagens."
Os três também não dizem se Félix e Niko terminarão a novela juntos e tampouco se vai sair o tão esperado beijo gay. "Quem torce muito por esse beijo é a minha mulher", diz Fragoso. "Ela fica lá em casa dizendo: 'É, você se diverte fazendo cena de beijo com as atrizes, agora eu vou à forra. Vai ser a minha vingança.'", conta aos risos.
Eu vejo uma trama mais preocupada com a comédia, em vez de mostrar gays que têm família. Os personagens ainda são muito órfãos. Eu sofro para dizer aquele texto, porque é algo que eu nunca diria, mas eu sou apenas um veículo para expressar o que o autor escreve. Com todas suas coerências e incoerências.
"Se for acontecer, será algo decidido aos 45 do segundo tempo", diz o diretor, que complementa: "Acho que a novela já quebrou tantos paradigmas que esse vai ser o de menos. Se acontecer, vai ser lucro."
O sofrimento de Antony
Enquanto Solano e Fragoso gravavam uma cena em que Niko insinua, entre carícias, que Félix deveria vir morar com ele, Marcello Antony, que interpreta o "banana" Eron, decorava seu texto em uma sala à parte.
Ele comentou com a reportagem o que os amigos e familiares gays falam sobre seu personagem. "Querem bater nele. E sempre digo que quero ser o primeiro a bater nele. Porque o que as pessoas não entendem é como ele, sendo um advogado renomado, caiu em uma lábia tão rasa quanto à da Amarylis [Danielle Winits]."
O ator também não acha que a discussão proposta pela novela tenha aumentado a tolerância com os homossexuais. "Acho que para se discutir os gays em uma novela no horário nobre, você tem que inserir os gays na sociedade. Eu abordaria outros temas. Por exemplo, eu inseriria a minha mãe achando ele muito fofo e vice versa. Eu vejo uma trama mais preocupada com a comédia, em vez de mostrar gays que têm família. Os personagens ainda são muito órfãos. Eu sofro para dizer aquele texto, porque é algo que eu nunca diria, mas eu sou apenas um veículo para expressar o que o autor escreve. Com todas suas coerências e incoerências."
Sobre o desfechos dos personagens gays, Antony acha que nenhum deles deveria terminar juntos. "Acho que Niko, Eron e Félix deveriam terminar cada um seguindo seu caminho. O Félix, por exemplo, não vejo maneira de ele se redimir. Mas o público não está nem aí para as maldades que ele fez. A gente vive em uma sociedade que não tem cultura de combater o corrupto, o ladrão."