No Rio, diretor de "Lost" diz que talento de Santoro não foi motivo de seu corte da série
André Gordirro
Do UOL, no Rio de Janeiro
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André Gordirro
Jack Bender, produtor de Lost, durante palestra do Rio Content Market
Jack Bender, produtor executivo e diretor de cerca de quarenta episódios de “Lost”, incluindo o controverso capítulo final, está no Brasil para participar do Rio Content Market, fórum voltado para produtores de conteúdo multimídia. Ele ocupa os mesmos cargos na novíssima “Alcatraz”, também uma cria de J. J. Abrams, e tem como projetos futuros uma série sobre viagem no tempo (“Rewind”, para o canal SyFy) e a retomada no cinema das aventuras de Jack Ryan, agora vivido por Chris Pine (o novo capitão Kirk).
"Lost” e “Alcatraz” dividiram as atenções da palestra. Bender encara sem problemas as inevitáveis perguntas sobre a primeira série, que saiu do ar em 2010. Por seis anos, ele trabalhou no Havaí junto com a equipe de produção e o elenco. “Brincávamos que nós éramos os sobreviventes.
Enquanto os roteiristas (Damon Lindelof e Carlton Cuse) permaneciam em Los Angeles, eu era o cara ao telefone que coordenava a produção. Eles escreviam as receitas; nós éramos os chefs”, define o produtor/diretor.
Jack Bender deveria ter dirigido o piloto de “Alcatraz”, mas estava ocupado com o desenvolvimento da volta de Jack Ryan às telonas (que ainda não aconteceu), e só entrou na série quando ela foi bancada pela Fox nos EUA. O programa gira em torno do desaparecimento de prisioneiros e guardas do famoso presídio de Alcatraz no momento de sua desativação, em 1963, e o retorno dessas pessoas ao presente, sem terem envelhecido um dia sequer.
Uma equipe investiga e caça esses perdidos no tempo. A ideia original é de dois roteiristas, Steven Lilien e Bryan Wynbrandt, que a ofereceram para a produtora de J. J. Abrams. “Ele ficou surpreso que até hoje não tivesse havido uma série chamada 'Alcatraz'. E como J. J. sempre foi fã de 'Além da Imaginação', ele se interessou pelo aspecto fantástico”, explica Bender, que exalta a capacidade da série de envolver vários gêneros, como o policial meramente investigativo e a ficção científica.
Isso não teve a ver com o talento de Rodrigo, e sim com a falha dos roteiristas, que criaram um personagem sem razão de ser. Damon e Carlton já assumiram publicamente essa culpa
Jack Bender, diretor de "Lost"Assim como “Alcatraz”, Jack Bender também não esteve presente no piloto de “Lost”, apesar de hoje a série ser praticamente um sinônimo de sua carreira. Depois que o episódio piloto, dirigido por J. J. Abrams, foi aprovado pela ABC, Bender foi contratado para coordenar a produção e eventualmente dirigir episódios-chave.
O escopo cinematográfico do piloto, ainda hoje o mais caro já realizado na TV americana, o deixou com o pé atrás. “Eu hesitei, pois sabia que não havia chance de manter aquele nível pelo resto da série, não com um orçamento televisivo. Felizmente, a série era sobre personagens, então eu sempre explorei muitos closes em contraponto às vistas panorâmicas impressionantes. 'Lost' não era uma série sobre monstros na floresta, e sim monstros dentro dos personagens”, explica Jack Bender.
Ele revela que o piloto foi escrito enquanto a produção ainda estava em andamento, e os personagens foram definidos na hora, baseados em pessoas disponíveis ou em atores com quem os produtores gostariam de trabalhar. Daniel Dae Kim (Jin), por exemplo, estava sob contrato com o estúdio e, por ser sul coreano, gerou a ideia de um personagem da Coreia do Sul que não soubesse falar inglês. “Foi a primeira vez no horário nobre que um protagonista de série não fala inglês”, relembra o produtor. Assim vieram outras apostas, como Evangeline Lilly, que até então só fizera pontas onde entrava muda e saía calada.
Segundo Jack Bender, eles e os demais criadores de “Lost” sempre tiveram noção de como a série se encerraria, sempre souberam como seria o início e o fim de cada temporada. “Só não sabíamos como chegar até lá. 'Lost' foi o primeiro programa de TV a marcar uma data para seu encerramento com 48 episódios de antecedência. Um exemplo de surpresa que ocorre no desenvolvimento de uma série foi o personagem de Michael Emerson (Ben) que apareceria por apenas três episódios”, explica Bender.
Ben, é claro, ganhou destaque e durou até o fim dos seis anos de “Lost” no ar. Mas houve casos em que os roteiristas perderam a mão, como aconteceu com o personagem de Rodrigo Santoro (Paulo), que surgiu do nada e desagradou os fãs. O brasileiro acabou cortado da série. “Isso não teve a ver com o talento de Rodrigo, e sim com a falha dos roteiristas, que criaram um personagem sem razão de ser. Damon e Carlton já assumiram publicamente essa culpa”, conta Bender. Com algum esforço, ele se recorda do episódio que menos gostou: o emblemático capítulo da terceira temporada em que a origem das tatuagens de Jack (Matthew Fox) é explicada. “Nossa, eu quase tirei esse episódio da cabeça”, diverte-se o produtor/diretor.
Uma coisa que não sai da cabeça de Jack Bender é seu novo projeto, “Rewind”. A série mostra o esforço de uma equipe composta por militares e cientistas civis para voltar no tempo e impedir uma explosão nuclear que tira Nova York do mapa. A máquina do tempo é um acelerador de partículas que o governo americano acreditava estar desativado. Seu funcionamento cria brechas fixas na linha temporal, por onde a equipe viaja para tentar remendar o futuro e impedir a catástrofe. “O grupo volta para datas específicas no passado, não é arbitrário”, conta o produtor/diretor. Por enquanto, não há nomes escalados para o elenco, nem uma data de estreia definida. Perguntado se viu “Timecop – O Guardião do Tempo” (1994), com um Jean-Claude Van Damme de mullet defendendo as linhas temporais, Jack Bender afirma que não assistiu ao pequeno clássico do astro belga e que “Rewind” segue outra filosofia. “Queremos mostrar como pequenos atos têm consequências no futuro, como as ondas de uma pedra jogada em um lago.” A torcida é que esteja mais para “Lost” do que para “Efeito Borboleta”.