A TV é o novo cinema, afirma produtor da série "Boardwalk Empire"
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AFP
Criador da série "Boardwalk Empire", Terence Winter, em festival de séries de TV em Paris (17/4/12)
Hollywood não faz mais o melhor cinema da atualidade, e sim as séries de televisão, afirma Terence Winter, premiado roteirista de "Família Soprano", a premiada série sobre a máfia, e criador de "Boardwalk Empire", sobre a época da lei seca.
Convidado de honra do Festival "Seriesmania", que atrai centenas de fãs a Paris, Winter faz uma clara distinção entre os programas dos canais a cabo, como a HBO, e aqueles repletos de clichês, concebidos sobretudo para vender produtos.
Antes da TV a cabo, as séries americanas eram orientadas pelas necessidades da publicidade, destacou Winter em uma entrevista à AFP em um hotel parisiense.
"Se resumiam a 'pegamos o culpado, solucionamos o crime e agora comprem este sabão", explicou.
Mas séries impecavelmente produzidas, como "The Wire" (HBO), a premiada "Mad Men" e "Breaking Bad" (ambas do canal AMC) mudaram as regras e se apropriaram da linguagem cinematográfica, para tratar de temas que Hollywood não se atreve a explorar.
"Estas séries têm em comum a honestidade e a surpresa", disse o vencedor de um prêmio Emmy, o Oscar da televisão.
"Às vezes estou assistindo uma série e não percebo (o desenlace). E quase caio da cadeira de surpresa", declarou o roteirista e produtor de 51 anos, que há 20 abandonou a carreira de advogado em Nova York e se mudou para Los Angeles com a aspiração de trabalhar com roteiros.
"Todos pensaram que eu estava louco", conta, antes de expressar a felicidade de viver o que é chamado de 'era de ouro' das séries, sobretudo pelos anos "repletos de magia" nos quais escreveu ou coescreveu 25 episódios de "Família Soprano".
Também não escondeu o desprezo pelo que é exibido na maioria dos cinemas do planeta, que leva a marca "made in Hollywood".
Winter recordou que nos anos 1960 e 1970 os indicados ao Oscar eram filmes como "Perdidos na Noite" ou "A Primeira Noite de um Homem", que conquistavam sucesso na bilheteria oferecendo "bons retratos de personagens".
"Agora os grandes sucessos de bilheteria são histórias de super-heróis, filmes quase apenas visuais, que qualquer um pode entender em qualquer do mundo. Parece que são feitos com uma mentalidade de 'mínimo denominador comum'", lamentou.
"As tramas são de robô bom, robô ruim: eles brigam. Isto é tudo que você precisa saber. E, além disso, você pode produzir bonecos iguais aos robôs e vender brinquedos, jogos eletrônicos", criticou.
Do outro lado está a liberdade criativa "quase sem restrições" oferecida pelos canais a cabo desde os anos 90, que "permite contar, com estilo e com meios financeiros, histórias originais, complexas, inteligentes, que assustariam as 'majors'", os grandes estúdios de Hollywood.
"O bom é que existe um público para estas séries. Um público que tem vontade de acompanhar com atenção uma história que exige um esforço. São séries que não obedecem o império do final feliz", celebra.
Por exemplo, "Boardwalk Empire", que tem entre seus produtores nada menos que Martin Scorsese, não hesita em abordar temas tabus em Hollywood, como o incesto, lembra Winter, que também não teve medo de matar um dos protagonistas da série ambientada em Atlantic City.
"Muitas vezes isto deixa as pessoas incomodadas, com mal-estar. Mas eu considero a única maneira de contar uma história", disse o escritor, que também comemora a diluição das fronteiras entre o cinema como arte e alguns telefilmes.
"Tentamos elevar nosso nível como arte", disse o escritor, que trabalha atualmente com Scorsese em dois projetos, entre eles um filme baseado em seu livro "The Wolf of Wall St", que será interpretado por Leonardo Di Caprio.
Winter e Scorsese também estão trabalhando em uma série para HBO em colaboração com o astro do rock Mick Jagger, dos Rolling Stones, que estreará em 2013 e que mostrará um executivo da indústria fonográfica em Nova York no início da década de 70.
"Nova York naquela época estava falida, era um período de muita loucura. E como acontece em tempos de convulsões econômicas e políticas, era um tempo muito fértil para os artistas", concluiu.