A história de Aline Borges com a televisão bem que poderia servir de roteiro para algum filme de nuances otimistas, daqueles que muita gente considera inverossímil.
Nascida e criada em Campo Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro, a atriz conta que vivia ouvindo do pai conselhos "realistas" com relação ao veículo. "Ele sempre dizia 'Aline, essa coisa de ator é para rico. A gente é simples, procura outra coisa. Isso tem muita panela'", relembra, aos risos. "Então, eu realmente achava que trabalhar em televisão era algo muito distante", conta ela, que hoje é um dos destaques da série "A Lei e O Crime", em que dá vida à violenta e passional Lacraia.
A pouca confiança da família na profissão, porém, nunca foi empecilho para que Aline "ralasse" para ganhar espaço como atriz.
Envolvida com teatro amador desde a adolescência, ela chegou até a varar noites nas coxias do teatro do Planetário da Gávea, na Zona Sul da cidade. "Eu fazia parte da companhia do Planetário e a gente ficava ensaiando até duas da manhã", recorda. Sem carro, ela dependia dos ônibus - que deixavam de circular à meia-noite.
"A gente esticava o casaco no chão do teatro e dormia. Eu nem falava isso para minha mãe, fui contar bem depois", diverte-se. O esforço, segundo ela, valeu a pena. Já aos 20 anos, no final da década de 90, Aline conseguiu uma tranquilidade financeira pouco comum até mesmo a atores mais experientes. "Nessa idade eu comecei a me sustentar com o teatro. Não preciso pedir dinheiro aos meus pais e, graças a Deus, consigo viver da minha arte", orgulha-se.
Hoje, o processo ficou bem mais "simples". De contrato assinado com a Record por três anos - prorrogáveis por mais um -, Aline é só sorrisos ao falar sobre Lacraia. Nome de guerra da traficante Maria do Socorro, a personagem parou nas mãos da atriz através de um convite. Ela só não sabe dizer de quem partiu a ideia - se do autor, Marcílio Moraes, ou do diretor Alexandre Avancini, com quem ela já havia trabalhado em "Coração de Estudante", na Globo. "Como não sei quem foi, agradeço a todos eles", brinca.
"Agradeço por eles terem acreditado em mim e espero não ter desapontado", empolga-se.
A tarefa de encarnar Lacraia não é fácil, realmente. Afinal, a jovem representa uma parcela bastante desconhecida do tráfico: as mulheres que estão na linha de frente do crime. "Eu pesquisei, mas achei pouquíssimas referências de mulheres com a mesma importância da Lacraia. Não consegui me inspirar em ninguém. É bom que não fica uma cópia", observa.
Para dar credibilidade à interpretação da vida bandida, Aline e os outros atores do seriado precisaram aprender a manusear armamentos pesados. Primeiro, tiveram aulas com o Bope, Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio. O objetivo era aprender a lidar com as armas - reais - com segurança. "Depois, os dublês foram ajudando a gente a desconstruir essa coisa 'limpinha' do Bope", explica a atriz.
Não deixa de ser curioso, porém, que a atriz se sinta desconfortável quando vê o resultado no ar. Nada a ver com a própria interpretação: para Aline, o mal-estar é fruto do realismo das cenas, cujas externas são gravadas na favela Tavares Bastos, na Zona Sul do Rio.
"Estou adorando fazer, mas eu não gosto muito de assistir a essas histórias. A vida já é tão dura, né? Prefiro ver coisas mais poéticas", confessa.
A ida para a Record aconteceu depois de seis anos na Globo, em que ela estreou como a Dolores de "Coração de Estudante". "Era um papel pequeno, mas em que eu comecei a aprender muito. Vi que não era tão simples fazer televisão", pondera Aline, que acumulou outros personagens pequenos.
O que poderia ser motivo de frustração é visto com ótimos olhos pela atriz, que não economiza elogios para a Globo. "Acho impecável o trabalho deles. Só tenho felicidade em lembrar os trabalhos que fiz lá", valoriza. "Sei que o mercado é concorridíssimo. Então, me sinto privilegiada por ter conseguido um espaço, mesmo que por pouco tempo", defende.
(por Louise Araújo)
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