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22/08/2007 - 22h00

"O tesão alimenta a alma", diz Karim Aïnouz, diretor da série "Alice", da HBO

MARINA CAMPOS MELLO
Da Redação
CENAS DE "ALICE", SÉRIE DA HBO
Divulgação/Record
Alice com o amigo Nicolas
Divulgação
Alice chega a São Paulo
Divulgação
Alice e sua meia-irmã Regina Célia
FOTOS DE ALICE
ENTREVISTAS COM ELENCO DE ALICE
Karim Aïnouz, diretor cearense do premiado filme "O Céu de Suely", que tem como protagonista uma garota que decide rifar o próprio corpo, volta a explorar o universo feminino. Mas, desta vez, a história de sua nova menina, Alice, será contada na televisão.

Em "Alice", título provisório da terceira série produzida pela HBO no Brasil, o cineasta contará as transformações por que passa a personagem, uma guia turístico que sai de Palmas, Tocantins, com casamento marcado, para enterrar o pai em São Paulo após seu suicídio.

Nos 13 episódios da série, que deve estrear no primeiro trimestre de 2008, Aïnouz e o baiano Sérgio Machado ("Cidade Baixa") também vão explorar a diversidade de imagens e pessoas da capital paulista, que funcionará como um dos personagens principais da trama. Alice, interpretada por Andréia Horta, se encanta com a cidade e decide ficar, deixando para trás um caminho seguro.

Para Karim, é muito bonita "essa falta de medo", "essa vontade de experimentar outra vida que não é aquela que está apontada para você", que, segundo ele, aparecem tanto em "Alice", quanto em "O Céu de Suely". Leia abaixo entrevista com o diretor, que fala sobre "Alice" e sobre a cidade de São Paulo.

UOL - Que tipo de histórias serão contadas na série "Alice"?
Karim Aïnouz - A série, protagonizada pela Alice, é uma espécie de crônica, pois fala do cotidiano dos personagens na cidade de São Paulo. Como é que eles trabalham, como é que eles acordam, como é que eles dormem, como é que é a vida cotidiana deles. E isso tudo se mistura às aventuras que se pode viver em uma cidade como São Paulo.

São crônicas, pois vamos contar os fatos banais da vida dos personagens, mas que de banais eles não têm nada. São os pequenos casos de amor, os pequenos problemas que você tem no trabalho, o estresse de chegar atrasado a algum lugar. A gente conta fatos que acontecem todos os dias em uma megalópole e torna esses fatos dignos de serem dramatizados. E, ao mesmo tempo, juntamos os pequenos dramas à aventura. São Paulo é o lugar onde a Alice vem viver as suas aventuras.

UOL - As personagens Hermila, de "O Céu de Suely", e Alice têm algo em comum?
Aïnouz - A Alice e a Hermila são as minhas queridas meninas. Elas têm uma coisa muito parecida. Elas são personagens que estão seguindo por um caminho da vida e que se dão conta de que pode haver outro. E elas vão tentar ver qual é esse outro caminho, apesar de não saberem qual é. Eu acho que isso é muito bonito, pois é uma coisa da juventude. É uma falta de medo e uma vontade de experimentar uma outra vida, que não é aquela vida que está apontada para você.

Acho que não falei com a ênfase necessária, mas elas são personagens extremamente corajosas. Tem um filme que eu adoro, que é um filme alemão, que eu acho que está entre os meus filmes favoritos, cujo título é "O Medo Devora a Alma". E aqui eu acho que é algo como "o tesão alimenta a alma", "o tesão vence o medo". O tesão no sentido mais bacana do termo. No sentido de que a falta de medo é sinônimo de vida.

UOL - Qual será a função de São Paulo na série?
Aïnouz - São Paulo é uma teia infinita de possibilidades, tanto de experiência humana, de arquitetura, quanto de geografia. Queremos usar a cidade como imagem e espelho do personagem. Se a Alice está muito alegre, filmamos a cidade a partir desse olhar. E também faremos o contrário. Por exemplo, no episódio cinco, a Alice passa por uma experiência traumática, muito dolorosa, mas ela está assistindo a um desfile de moda. Mostraremos a dor por contraposição: mostraremos o brilho do desfile e a beleza da moda. Há um contraste das cores com o que a personagem está sentindo. Tentaremos usar sempre São Paulo dramaticamente, seja a favor, no sentido de ser o espelho, seja de forma contrária, opondo as imagens ao que o personagem está sentindo.

UOL - Por que Alice vem de Palmas?
Aïnouz - Palmas [capital do Tocantins] é o extremo oposto de São Paulo. São Paulo é caótica, é acúmulo, é não-planejamento, densidade. É um céu mais preenchido pelos prédios do que pelo céu em si. E Palmas é o absoluto oposto disso: é uma cidade plana, planejada, que tem 17 anos, que ainda não está ocupada, que não tem quase prédios, deve ter três ou quatro. Palmas tem muita água, pois fica à beira do rio Tocantins. A gente imaginou que era uma cidade que visual e dramaticamente funcionaria perfeitamente como um contraponto a São Paulo.

O primeiro episódio tem muitas imagens de Palmas, depois Palmas permanece em todos os episódios porque ela [Alice] telefona para a avó que ficou lá. Ela também deixou em Palmas o cara com quem ela iria se casar. A gente está sempre se relacionando com Palmas através da Alice e através de seus telefonemas. Também estamos considerando a possibilidade de ter Palmas no último episódio. É uma presença constante que vai temperando todos os episódios e criando essa sensação de cheio e de vazio. A série é basicamente sobre um personagem que sai de um lugar vazio e vai para um lugar cheio.

UOL - Qual é a sua relação com São Paulo?
Aïnouz - Em São Paulo, a gente está sempre descobrindo uma coisa nova, passando por um lugar que você nunca viu. São Paulo é uma cidade aonde eu já vim muito, já freqüentei, mas é uma cidade na qual eu nunca morei. É uma cidade com a qual eu tenho uma relação bastante conflituosa. É uma cidade que eu acho, em alguns momentos, fascinante e, em outros momentos, sufocante. Ela tem esses dois lados, que é clássico de uma megalópole como a Cidade do México, como algumas cidades da Ásia, como Taipei. São cidades fascinantes e liberadoras, mas que também te fazem se sentir afogado.

UOL - Você falou que está tentando achar um ícone que possa representar São Paulo. O que você já encontrou?
Aïnouz - Temos que ir escolhendo algumas imagens da cidade, mas o problema é que não podemos escolher muitas. Temos que eleger cinco vistas de São Paulo que, quando você fecha o olho, você consiga identificá-la. Tóquio, por exemplo, eu não consigo fechar o olho e saber identificar a cidade imediatamente, como acontece com Nova York, Londres ou Paris. O desafio é, com poucas imagens, conseguir dar uma cara do que é São Paulo. Mas é bem difícil, bem difícil.

São Paulo tem, por exemplo, um skyline sem fim, muito característico. Não é um skyline que tem só um primeiro plano. É um mar, com as colinas que sobem e descem cheias de prédios. Essa seria uma imagem clássica de São Paulo. Outra imagem que eu acho muito bacana é na Avenida 9 de Julho. Lá há um corredor de prédios, com a avenida que desce e com uma série de viadutos que cruzam a avenida. Parece que você está em um filme do Batman. É muito bonito. E para filmar é incrível. Uma das nossas locações tem essa vista. O Copan também é um lugar muito importante, assim como a praça Roosevelt.

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