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06/06/2011 - 07h00

Ana Lúcia Torre diz que Tia Neném agrada "aos maridos que não gostam de novela"

CARLA NEVES
do UOL, no Rio
Veja momentos marcantes da carreira de Ana Lúcia Torre
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Aos 66 anos, a paulistana Ana Lúcia Torre, a Tia Neném de “Insensato Coração”, da Globo, diz viver um dos melhores momentos de sua carreira de 34 anos na TV. Em entrevista exclusiva ao UOL, a atriz –que estreou na novela “Dona Xepa”, exibida em 1977 na Globo –afirma que está lisonjeada com a repercussão da fofoqueira personagem e revela que tem se surpreendido com o sucesso de Tia Neném com o público masculino. “Muitas mulheres me falam que os maridos não gostam de novela, mas elas têm que chamá-los na hora que eu entro. A Deborah Secco me falou que o Roger [marido da Deborah] não assiste à novela, mas que ela precisa chamá-lo quando entra a Tia Neném [gargalhadas]. Fiquei lisonjeadíssima”, conta.

Ao contrário de Tia Neném, que não tem filhos e adora dar pitaco na vida dos sobrinhos, Ana Lúcia diz ser avessa à fofoca. Em comum com a tia de Léo (Gabriel Braga Nunes) e Pedro (Eriberto Leão), ela só tem o bom humor. “Sou uma palhaça. É uma farra na minha casa [risos]. Moro com a minha mãe, Antonieta, de 86 anos, e tenho dois netos: o Marcos, de 5 anos, e o André, de 3, com quem brinco, rolo no chão”, diz ela, que tem um filho único, Pedro, pai dos dois meninos.

Com a carreira mais voltada para o teatro, e, de uns tempos para cá, para o cinema, Ana afirma que só agora, depois de três décadas na TV, tem se sentido à vontade em frente às câmeras. “Depois de tantos anos de carreira, estou me sentindo à vontade nos três veículos [risos]. Mas custou! Porque só me sentia mais à vontade, um pouco mais à vontade, no teatro. Agora não, tudo é gostoso”, declara ela, aproveitando para revelar o que mais gosta na profissão de atriz: “Estudar a vida inteira e saber que vou poder trabalhar até os 90 anos de idade, coisa raríssima em outras profissões [risos]”. Leia a seguir a entrevista com Ana Lúcia:

UOL – Em "Insensato Coração", o núcleo de personagens que vivia em Florianópolis deixou a cidade. Qual será o destino de Tia Neném na novela?

Ana Lúcia Torre – Tia Neném vai para o Rio [risos].

UOL – E ela vai morar aonde?

Ana Lúcia Torre – É lógico que, de cara, ela vai para a casa da Wanda (Natália do Vale), que é o apartamento do Leo (Gabriel Braga Nunes). As duas vão continuar brigando muito e aí ela vai para o bar do Gabino (Guilherme Piva), vai para a Gamboa, para a casa do Raul (Antonio Fagundes), para a casa de Natalie (Deborah Secco).

  • Divulgação/TV Globo

    Wanda (Natália do Vale) e Tia Neném (Ana Lúcia Torre) em cena de "Insensato Coração"

UOL – Mas qual vai ser a desculpa para ela se mudar de Florianópolis para o Rio?

Ana Lúcia Torre – Uma homenagem que vai ter para o Léo (Gabriel Braga Nunes). Então a desculpa é participar de uma homenagem a esse sobrinho tão querido, né? [fala como se fosse a Tia Neném]. Mas ela vem com uma mala descomunal de grande. E a Wanda fica louca com o tamanho da mala.

UOL – Então Tia Neném vai morar de vez no Rio?

Ana Lúcia Torre – Estou achando que ela vai ficar. Gostaria que ela fosse para a casa da Fabíola (Roberta Rodrigues). Imagina? Ia enlouquecer a Fabíola e encher a cara no bar do Gabino todo dia. Uma delícia! [risos]

UOL – Quando o diretor Dennis Carvalho te convidou para a novela , ele avisou que a Tia Neném não ficaria até o fim da trama...

Ana Lúcia Torre – É. Eu ficaria no máximo até abril, mais ou menos, metade da novela. Ele e o Gilberto [Braga] me garantiram isso.

UOL – E muita gente torce para que ela fique até o fim da trama, em agosto. A que você atribui esse sucesso todo da Tia Neném?

Ana Lúcia Torre – Segundo o que soube pelo pessoal do site da novela, parece que começou a chegar muito e-mail pedindo para ela ficar. E realmente é uma coisa tão incrível! Por exemplo, quando fiz a Débora em “Alma Gêmea” foi um sucesso aquele personagem, mas não chega aos pés do que está acontecendo hoje com a Tia Neném, que é um personagem pequeno dentro de toda a trama. Ela não tem uma função determinante na novela. Ela é a parte relaxada. Gravo pouco. E é uma festa sair na rua.

UOL – O que as pessoas mais falam para você?

Ana Lúcia Torre – Primeiro que elas já vêm dando risada, dizendo que se divertem muito com a Tia Neném. Muitas mulheres –ontem mais uma me falou isso – que os maridos não gostam de novela, mas elas têm que chamá-los na hora que eu entro. A Deborah Secco me falou que o Roger [marido dela] não assiste à novela mas que ela precisa chamá-lo quando entra a Tia Neném [gargalhadas]. Fiquei lisonjeadíssima.

A Deborah Secco me falou que o Roger [marido dela] não assiste à novela mas que ela precisa chamá-lo quando entra a Tia Neném [gargalhadas]. Fiquei lisonjeadíssima.

Ana Lúcia Torre, atriz

UOL – Então ela faz sucesso com os maridos da casa?

Ana Lúcia Torre – Os maridos todos [risos]. E outra coisa que é muito comum eu ouvir é o seguinte: “eu tenho uma Tia Neném na minha família”. Acho que as pessoas se identificam e também tem a brincadeira porque ela é a parte leve da novela. Realmente é uma novela que tem núcleos bastante pesados. E a Tia Neném não. É uma ilhazinha no meio desse tumulto, que é normal, cada um tem a sua história, as histórias são fortes. E ela não. Ela vem para dar um respiro em momentos de muita tensão, eu acho.

UOL – Como foi o processo de composição da Tia Neném? Você se ateve apenas ao texto do Gilberto Braga e do Ricardo Linhares ou buscou inspiração em alguma pessoa conhecida? Conhece alguma Tia Neném?

Ana Lúcia Torre – As referências que eu tinha eram simples: uma mulher fofoqueira, que bebe escondido. Não tinha muita coisa, até porque a Tia Neném não temuma vida particular que tenha uma história própria dela. Mas eu acho assim: eu tenho de 36 para 37 anos de carreira. Já transitei por personagens que tinham características muito interessantes. Fora isso, acho que todo mundo tem uma vizinha que extrapola um pouco na fofoca, uma tia ou uma avó que quer chamar a atenção. Às vezes até e principalmente porque são pessoas muito solitárias. Então fui pegando um pouquinho dali e aí ela veio vindo, devagarzinho. Não foi nada assim: “ela será assim”. Eu fui fazendo, falando e ela foi indo, indo, até que tomou uma forma.

UOL – Mas ela sempre teve a função de ser divertida dentro da trama? Nunca houve o propósito, por exemplo, de abordar questões mais sérias, como o alcoolismo, por exemplo, através dela?

Ana Lúcia Torre – Não, não. Até porque ela não é alcoólatra. Absolutamente. Ela só bebe um licorzinho, fecha a porta e acabou o licorzinho [risos]. Ela não tem essa conotação de alcoolismo. Ela extrapola nas festas e solta mais a língua do que deve. E o básico era esse. É o personagem mais engraçado da novela. Isso foi o que me foi dito desde o início.

UOL – Quando você acha que foi o auge do humor dela?

Ana Lúcia Torre – Acho que foi naquela fase em que ela ficou morando com a Wanda (Natália do Vale). Foi maravilhoso aquilo! A gente adorou, eu e a Natália. Tanto que quando a Tia Neném mudar para o Rio de Janeiro, ela vai direto para a casa da Wanda. E ela enlouquece. E pergunta: “escuta, vai ficar aqui até quando, Tia Neném?”. E eu respondo: “você ficou na minha casa quanto tempo?”. É assim. É nesse nível [risos].

UOL – Até porque a Wanda também tem um quê de trapaça...

Ana Lúcia Torre – É. Ela tem todos! [risos] Um dia eu lembro que a Tia Neném falou para a Wanda que o Leo tinha a quem puxar.

UOL – Sua primeira novela foi “Dona Xepa”, também do Gilberto Braga, né?

Ana Lúcia Torre – “Dona Xepa” foi uma coisa fantástica porque o meu personagem, a Glorita, é uma coisa inesquecível. Ela era a antagonista da Xepa e cômica. Era uma delícia! Ela queria de qualquer forma pertencer à alta sociedade. Mas não tinha educação para isso, não tinha dinheiro, não tinha nada. Fazia umas coisas muito loucas. Foi um personagem queridíssimo na época. E depois nunca mais fiz Gilberto.

  • Divulgação/TV Globo

    Ana Lúcia Torre em cena da novela "Dona Xepa", da Globo (1977) (2/5/2011)

UOL –Por quê?

Ana Lúcia Torre – Não sei. Nunca mais fui chamada para fazer outra novela dele. Fiz muito mais teatro do que televisão nesses anos todos.

UOL – E você também morou um tempo fora, na Europa?

Ana Lúcia Torre – É. Mas comecei a minha carreira profissional depois que voltei da Europa. Já fazia teatro amador. Mas quando voltei que comecei o profissional. Na televisão, realmente fiz coisas de muito sucesso, mas trabalhava por obra. Então fiz “Dona Xepa”, “Tieta”, em que eu fazia uma hipocondríaca, que vivia de luva, tinha medo de micróbio. Depois fiz um outro personagem fantástico em “A Indomada”. Era mulher do Ary Fontoura, que tratava ela como um zero à esquerda, chamava ela de burra, idiota, isso, aquilo, aquilo outro. E ele tinha um casinho com o personagem da Eva Wilma. No final, eu tiro toda a grana dele e viro prefeita da cidade. Quer dizer: a aparente burrice era só aparente. De burra ela não tinha nada. Eu nunca me esqueço do dia em que meu personagem mostrou ao marido que tinha tirado tudo dele – porque ela era vítima de maus tratos... Eu estava andando em Botafogo [zona sul do Rio] e escuto uma buzina na calçada. Quando eu olhei era uma Kombi aos pedaços, e um homem desdentado, dentro dela, gritando: “e aí? Muito bem! Arrancou todo o dinheiro do velho! Eu bati muita palma ontem na novela!”. Foi uma gritaria, todo mundo parou na rua para ver, foi uma delícia! [risos] Mas nunca como a Tia Neném.

UOL – E o curioso é que você estreou na TV em uma novela do Gilberto Braga e é com um personagem também dele que você está se consagrando no veículo, né?

Ana Lúcia Torre – Fora o “Alma Gêmea” que foi um papel muito sério –ela era a vilã. Na verdade, a mãe que comandava as vilanias da filha. Fora esse  personagem, tanto “Tieta” quanto “A Indomada” e “O Cravo e a Rosa” e “Sete Pecados”, que eu fazia uma anja doida de pedra, e a Tia Neném, todos são personagens bem cômicos. Eu adoro fazer comédia.

UOL – A que você atribui o fato de ser vira-e-mexe convidada para fazer personagens cômicos na TV?

Ana Lúcia Torre – Não sei. O Walcyr [Carrasco] me convidou para fazer o papel de “Alma Gêmea”, que era terrível, seríssimo, dramático, e eu lembro que uma vez ele foi me ver no teatro, fazendo um Molière. E no final do espetáculo ele virou para mim e falou: “Ana, você é muito engraçada! Vamos embora fazer comédia!”. E, em seguida, ele me deu a anja de “Sete Pecados” que era doida. Já começava caindo no telhado. E não podia ver homem que ficava doida. Então eu não sei... Foi legal do Walcyr ter me visto em uma outra coisa. E aí pronto: estou eu aqui.

UOL – Mas você prefere fazer comédia?

Ana Lúcia Torre – Eu gosto de qualquer coisa. Adoro trabalhar. Agora, comédia eu gosto muito. Só que comédia é muito mais difícil. Já fazer chorar, você vai pela emoção e faz a pessoa chorar. Fazer rir é bem mais difícil. O difícil da comédia é você achar a linha exata entre o deboche e a caricatura. Porque entre a comédia e o drama existe, eu diria, só meio degrau de diferença. Porque na comédia, você fazer as pessoas rirem, e fazer isso durante meses, você tem que fazer com muita seriedade, com uma verdade absoluta. Quanto mais de verdade você fizer, mais ela vai ficar engraçada.

UOL – Você acha que o humor é o que mais te aproxima da Tia Neném? Você é engraçada no dia a dia?

Ana Lúcia Torre – Sou uma palhaça. É uma farra na minha casa [risos]. Eu moro com a minha mãe, Antonieta, de 86 anos, e tenho dois netos: o Marcos, de 5 anos, e o André, de 3, com quem brinco, rolo no chão. Mas também sou séria. Na hora que o negócio aperta, “vovó Ana” [como eles me chamam] fica séria.

UOL – Você está em cartaz com alguma peça no teatro?

Ana Lúcia Torre – Fiquei em cartaz no Rio com a peça “Quanto Tempo da Vida Eu Levo Para Ser Feliz?”, no CCBB, mas já não estou mais. Mas vou fazer um espetáculo em São Paulo, com direção do Alexandre Reineck, que também é uma comédia, por acaso. Porque acabei de fazer antes dessa “Quanto Tempo da Vida Eu Levo para Ser Feliz?”, em São Paulo, uma peça seríssima chamada “Seria Cômico Se Não Fosse Sério”, de Dürrenmatt. Linda a peça! E agora vou fazer “Como Se Tornar Uma Super Mãe em 10 Lições”. É claro que é uma mãe judia. A peça deve estrear em janeiro, em São Paulo.

UOL – E o cinema? Em 2010, foi lançado o filme “Reflexões de Um Liquidificador”, em que você atua...

Ana Lúcia Torre – O cinema tem me dado uma enorme satisfação. Este ano ganhei dois prêmios por causa desse longa do André Klotzel. Acabou de sair em DVD e é um filme genial. É um roteiro absurdo, muito bom.

  • Ricardo Leal/UOL

    Ana Lúcia Torre no intervalo das gravações de "Insensato Coração", no Projac (2/5/2011)

UOL – Então você gosta de transitar por todos os veículos: TV, teatro e cinema...

Ana Lúcia Torre – Gosto. Cada um tem a sua característica, evidentemente, e agora, depois de tantos anos de carreira, estou me sentindo à vontade nos três [risos]. Mas custou! Porque só me sentia mais à vontade, um pouco mais à vontade, no teatro. Agora não, tudo é gostoso.

UOL – Mas por que você não se sentia à vontade fazendo TV antes?

Ana Lúcia Torre – Porque era tudo muito estranho, muito fora da minha realidade, muita gente, enfim, cada semana chegando um texto. Não tinha um texto pronto. E aí um dia me chamaram para fazer cinema e, depois do primeiro dia de filmagem, falei: “gente, acho que gostei muito de brincar disso!” [risos]. Cinema gostei muito logo de cara. Mas você tem que ter uma energia e uma disposição grande.

UOL – O que mudou da TV de 1977, quando você estreou em “Dona Xepa”, para a TV de hoje, de “Insensato Coração”?

Ana Lúcia Torre – Acho que, sem dúvida alguma, nós temos uma teledramaturgia incrível, uma produção de teledramaturgia que eu acho difícil você ver em qualquer outro lugar do mundo. É claro que a técnica é muito desenvolvida nos EUA e na Europa, mas eles fazem minisséries, são coisas preparadas com muita antecedência. Mas quando a gente conta para qualquer pessoa do exterior que a gente grava recebendo o roteiro dos capítulos uma semana antes e gravando o número de cenas que a gente grava por dia eles não acreditam que o resultado possa ser tão bom. E é. É quase um filme por dia. Então acho que nós chegamos a um nível de profissionais, dentro da emissora, na parte técnica e artística, capacitadíssimos como em nenhum outro lugar. Claro que, antigamente, era muito mais tranquilo. Lembro que no tempo em que gravava “Dona Xepa”, gravava segunda, terça e quarta estúdio e sábado externa. E pronto. Fazia-se tudo, dava tempo. Ninguém tinha que sair do estúdio, ir para a externa e voltar para o estúdio. Claro que as coisas eram mais simples, mas fazia-se. Mas acho que foi esse início que nos deu esse lastro para fazer o que fazemos hoje tão bem.

UOL – O que você acha melhor na profissão de atriz?

Ana Lúcia Torre – Duas coisas: estudar a vida inteira e saber que vou poder trabalhar até os 90 anos de idade, coisa raríssima em outras profissões [risos].

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