"Brasileiro vê mais televisão do que deveria", diz Serginho Groisman

Mauricio Stycer

Do UOL, em São Paulo

Comemorando 13 anos de "Altas Horas", Serginho Groisman se diz feliz com a mudança de horário do programa, que deixou a madrugada e agora vai ao ar depois do "Zorra Total", aos sábados. A audiência, diz, dobrou. Saiu de uma média de 6 pontos para uma faixa entre 10 e 12 pontos.

No novo horário, a concorrência é mais dura, especialmente do programa "Legendários", da Record. Mas diz que não sofre nenhuma pressão para tornar o "Altas Horas" mais popular. "Posso chamar atrações mais populares ou mais sofisticadas, mas não vou conseguir fazer diferente do que faço."

Aos 63 anos, sem a preocupação de esconder os cabelos grisalhos, Serginho faz uma avaliação surpreendente para alguém que há quase 25 anos trabalha na televisão: "Eu acho que pessoas no Brasil veem muito mais televisão do que deveriam." O apresentador também acha que, apesar disso, não se deve subestimar a inteligência do público: "As pessoas não se pautam pela TV".

  • Mauricio Stycer/UOL

    Serginho Groisman em entrevista ao UOL

Serginho recebeu o UOL para esta entrevista exclusiva em sua sala, na Globo, em São Paulo. Abaixo, os principais trechos da conversa:

UOL - Treze anos de "Altas Horas", quase 25 anos de TV, sempre falando diretamente aos jovens, sempre muito animado. O que te motiva hoje na TV?
Serginho Groisman – Tenho uma formação jornalística. Comecei na TV com 38 anos. Quando pensei em TV, pensei em ser um jornalista na TV. Quando apareceu a oportunidade do auditório, comecei a tentar, e é isso que ainda me motiva, unir entretenimento com jornalismo. E fazer com que as pessoas venham a um programa de auditório para participar, não apenas aplaudir.

Esta ideia, participar e não apenas aplaudir, vai na direção oposta à maioria dos programas de auditório.
Acredito que sim. No "Programa Livre" (SBT), que era diário, passaram 500 mil pessoas. Aqui, já tem quase 200 mil. Tem gente que viaja quase 24 horas. Elas vêm por um motivo: elas entendem que podem participar e, até, transformar, com uma pergunta ou uma opinião, como muitas vezes aconteceu, um programa.

Você está dizendo que não vai fazer o espectador viajar 24 horas para chegar aqui e bater palmas?
Eles sabem disso e eu sei disso. Tanto é que a iluminação do programa não privilegia ninguém, com exceção do momento musical. É um conceito de proximidade. Não estou aqui exaltando em excesso a qualidade da plateia, porque ela é um retrato da educação brasileira. Tem coisas boas e coisas ruins.

Ao final do seu último programa, você escreveu no Twitter: "Nunca subestimem a inteligência do espectador que na verdade é o protagonista". A quem se dirige esta mensagem?
O programa mudou de horário. Agora é mais cedo e tem uma pressão maior por audiência. E quando falo pressão não é que alguém me cobre; eu me cobro. Estou ainda percebendo este horário. Para ter audiência, você tem algumas fórmulas não-difíceis. Artistas bem populares e tal. O desafio, desde que comecei em televisão, é combinar audiência com o que eu considero qualidade. Escrevi essa mensagem depois de um programa que teve o Rappa, não foi tão popularzão, no geral, e teve uma audiência muito boa. Acho que, às vezes, a gente subestima o espectador. Eu acho que pessoas no Brasil veem muito mais televisão do que deveriam.

O desafio, desde que comecei em televisão, é combinar audiência com o que eu considero qualidade. Acho que, às vezes, a gente subestima o espectador

Por quê?
Há alguns fatores. A televisão é um entretenimento muito barato. O grosso da população que vê TV não tem tanta grana, não tem essa coisa de pegar o carro, ir no show, pagar estacionamento, bebida, comida... Fim de semana as pessoas gostam de ver televisão. É uma cultura um pouco brasileira. Mas acho que se vê demais televisão. As pessoas realmente deveriam sair, ler mais, ter outras fontes de entretenimento. Fala-se muito que hoje as pessoas estão indo para a internet, mas eu reparo que o assunto número um da internet é a televisão.

Voltando à mensagem que você escreveu. Você está dizendo que não precisa baixar o nível para conseguir audiência. Mas você tem sido pressionado? Te pedem para trazer músicos mais populares? Um sertanejo?
Não. Nunca. De verdade, por onde eu fui trabalhar, a exigência inicial era essa. "Por favor, você está comprando um pacotinho. E o primeiro item do pacote é liberdade." Claro que sei onde trabalho, conheço os códigos, sei o espaço que tenho, as limitações editoriais, como todo mundo. Agora, dentro de onde estou, não tem pressão para colocar esse ou aquele (artista) nem pressão, pelo menos até hoje, por audiência. Até porque a gente está indo muito bem.

No novo horário a audiência aumentou?
Quase dobrou. Hoje está entre 10 e 12 pontos. De madrugada, dava 5, 6, 7 pontos.

Por que o programa mudou de horário?
Vivi 12 anos aqui num horário muito tarde. Sempre pedi para ir ao ar mais cedo. Houve uma renovação na Globo e aprovaram. Cheguei a entrar às 2 da manhã. Então, acho que não se deve subestimar a inteligência do público porque as pessoas, apesar de verem muito, não se pautam pela televisão. Do contrário, a gente não teria tido os governos Brizola, Lula, Dilma... Não teria uma série de conquistas democráticas. Dizem que a televisão prejudica o senso crítico. Acho que a TV é uma mão dupla. O poder do espectador é muito maior. Com o controle remoto e a TV paga, as pessoas conseguem fugir mais facilmente da televisão, se elas quiserem. Isso também depende da educação. Se você ler mais, você vai ter um espírito crítico maior, vai poder discernir melhor... saber se estão te enganando.

Você está dizendo que Brizola, Lula e Dilma venceram eleições apesar da televisão?
Não. O Brizola foi uma vez no "Programa Livre", já governador. E ele reclamou muito da televisão. E eu falei: "Você foi eleito, apesar desta reclamação constante." Se tivesse esse poder tão forte, a gente não teria governos que reclamaram da televisão. O Brasil vai seguir com as conquistas democráticas, com ou sem a mídia a favor ou contra. E aí não coloco só a televisão.

Então, acho que não se deve subestimar a inteligência do público porque as pessoas, apesar de verem muito, não se pautam pela televisão. Do contrário, a gente não teria tido os governos Brizola, Lula, Dilma... Não teria uma série de conquistas democráticas

A concorrência hoje na TV está mais acirrada do que há 13 anos, quando você estreou o "Altas Horas". Como você avalia este momento?
A TV paga mais barata, atraindo mais gente, com filmes dublados, é uma concorrência muito grande. O cabo hoje é o segundo lugar de audiência. Isso é uma concorrência inevitável, como ocorreu nos Estados Unidos. Não dá ainda para dimensionar até onde vai este recuo geral de audiência. Outros canais também se fortaleceram. As pessoas procuram outras formas de entretenimento.

De que forma isso afeta o teu trabalho, a pauta do teu programa?
Por enquanto, nada. Eu não posso fazer uma televisão só para mim e meus amigos. Uma TV que eles vão dizer: "Que bacana, que resistência!" Tem que misturar. Outra coisa: o importante não é quem você chama, mas o que você faz com essa pessoa. Algumas coisas são características de quem faz. Isso é difícil mudar. O programa de auditório é muito marcado pela personalidade de quem apresenta. Posso chamar atrações mais populares ou mais sofisticadas, mas não vou conseguir fazer diferente do que faço.

Você tem medo de descaracterizar o programa?
Acho que nem vou conseguir fazer certas coisas. Até invejo pessoas que fazem coisas que eu não faço, bem mais soltas e populares. Admiro Chacrinha, Silvio Santos... Eles fazem coisas que eu não conseguiria fazer, que é de uma ousadia muito forte.

Eu não posso fazer uma televisão só para mim e meus amigos. Outra coisa: o importante não é quem você chama, mas o que você faz com essa pessoa

Os seus cabelos hoje estão grisalhos. Diferentemente de outros apresentadores, você não parece preocupado em esconder a idade. Isso não é um problema num programa jovem?
No SBT, comecei com 40 anos. Já comecei um pouco com essa cara. Nunca me preocupei nem com a roupa nem em tentar ganhar do tempo através do meu físico ou do verbo. Tipo, qual é a última gíria ou qual é a balada de hoje? Ia ser ridículo. Não me preocupo. Eu me vejo como apresentador que dá voz para outras pessoas. Se você reparar, eu falo muito pouco para a câmera.

O que você gostaria de fazer, que ainda não fez, na televisão? 
Gostaria de ter um programa onde eu pudesse entrevistar as pessoas. Tipo um talk show. As perguntas que faço no "Altas Horas" representam só um quarto ou um quinto do programa.

 

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