Avenida Brasil

Letícia Isnard, a Ivana de "Avenida Brasil", diz que autor se decepcionou por ela não ser feia e gorda

Renato Damião

Do UOL, no Rio

No ar em “Avenida Brasil”, Letícia Isnard vive a divertida Ivana, irmã do ex-jogador Tufão (Murilo Benício) e casada com o vilão Max (Marcello Novaes). Se nas telas a atriz aparece sempre com visual extravagante e aparenta uns quilinhos a mais, pessoalmente a imagem se desfaz.

Letícia se encontrou com a equipe do UOL em uma loja de doces na zona sul do Rio. De saia jeans e cabelos molhados, ela pouco lembra a perua emergente da trama das nove da Globo. “As pessoas sempre dizem que eu não sou gorda como na TV”, revelou ela, que decepcionou inclusive João Emanuel Carneiro, autor da novela.

 “Inicialmente eles tinham pensado na Ivana gorda e feia. Quando o Ricardo Waddington [diretor] me apresentou ao João ele disse que eu era bonita, mas não de uma maneira feliz. E contou que eu não era exatamente o perfil da personagem. Então eu falei para ele não se preocupar que eu era uma boa atriz”, relembrou Letícia que iniciou na televisão com o seriado “Minha Nada Mole Vida”.

Antes de “se jogar no abismo de viver só de teatro”, Letícia foi bailarina, dos 11 aos 23 anos, e cursou faculdade de Ciências Sociais. Em seguida chegou a fazer mestrado e ganhou bolsa em uma fundação americana para estudar a ditadura militar nos países da América do Sul. “Em 2001 cogitei a ir estudar em Nova York, mas acabou rolando os atentados terroristas e fiquei no Brasil. Entrei numa companhia de teatro e estou lá até hoje”, contou referindo-se ao grupo “Os Desequilibrados”. Leia a entrevista completa:

André Durão/UOL
A Ivana é uma tia minha e ela sabe disso. A minha tia é uma pessoa que para ela não tem tempo ruim. A casa pode estar caindo, mas ela sempre vai arrumar motivos para fazer uma piada, de sacudir a poeira. Essa coisa solar, esse voto da alegria eu levei para a Ivana

sobre a personagem Ivana

UOL – Como foi seu processo de composição para a Ivana?
Letícia Isnard – Eu nunca lia a sinopse da novela, então o que eu tinha de informação para trabalhar era que ela era irmão do Tufão e a Ivana não é uma encostada. Ela é a única pessoa que trabalha naquela família. Acho que ela tem uma noção de administração de empresa, que estudou, mas as outras coisas surgiram com a maquiagem, o figurino.

Mas como o figurino pode te ajudar nessa composição?
Para mim faz muito diferença me ver caracterizada. O sapato é fundamental para compor um personagem por que é um jeito de andar que você vai descobrindo, e a Ivana ainda tem essa coisa de muitas joias que dá outro movimento para as mãos.  Ela também usa roupas muito apertadas e justas, que eu não uso no meu cotidiano. Tem gente que acha que sou gorda, mas é um trabalho da figurinista.

Você chegou a buscar inspiração em algum lugar? Tem alguma coisa sua na Ivana?
A Ivana é uma tia minha e ela sabe disso. A minha tia é uma pessoa que para ela não tem tempo ruim. A casa pode estar caindo, mas ela sempre vai arrumar motivos para fazer uma piada, de sacudir a poeira. Essa coisa solar, esse voto da alegria eu levei para a Ivana. Eu também estou colocando um monte de coisas minha na Ivana. Ela é esperta e ingênua ao mesmo tempo, ela não é uma ingênua boba. Acho que ela é ingênua no sentido de que ela acredita nas pessoas. Eu sou assim, primeiro eu acho que você é legal até que você me prove o contrário. A gente sempre se apropria e vai dando coisas nossas ao personagem, é um castelinho de areia que vamos construindo aos pouquinhos.

Uma das características que fazem sucesso na Ivana é a linguagem tatibitate que ela usa para se referir ao marido. Isso veio no texto ou foi uma coisa levada por você?
Isso já estava no texto. Na cena do teste que fiz em outubro de 2011 já havia essa rubrica para falar com linguagem tatibitate. Inicialmente eles tinham pensado nela gorda e feia e eu não sou gorda e feia então a gente investiu pesado nessa coisa dela ser mala. Então eu estou sempre agarrando o Marcelo. Eu digo que ela é a mulher chiclete. Depois das mulheres frutas tem as mulheres chicletes que estão sempre sufocando os namorados.

E a brincadeira com os florais? Também foi ideia do João Emanuel?
Os florais fui eu. Na verdade eu queria que a Ivana fosse fumante porque eu acho que ela é extremamente compulsiva e nervosa, mas não pode fumar na televisão. Então na minha cabeça eu criei uma historinha que ela está parando de fumar e a maneira dela se acalmar seriam os florais. Então eu pedi para a Amora Mautner [diretora] quando veio a sequência do sequestro da Carminha se eu poderia colocar um floral na cena e ela deixou.

Mas os florais que você usa em cena são de verdade?
Sim, são. Eu ia trocar e colocar água, mas o floral é meio amargo então ele dá uma estranheza, quando eu coloco na boca acabo fazendo uma careta e eu achei que era bom deixar.

E está funcionando?
Tá ótimo, a autoestima está ótima. A Ivana é meu floral. [Risos]

Eu queria que a Ivana fosse fumante, mas não pode fumar na televisão. Então na minha cabeça eu criei uma historinha que ela está parando de fumar e a maneira dela se acalmar seriam os florais

sobre o uso dos florais em cena

Como você acha que a Ivana vai reagir quando descobrir que o Max é amante da Carminha?
O João [autor] é uma incógnita. Ainda não sei o que vai acontecer, mas como o João gosta de trabalhar isso de que as pessoas não são totalmente boas, nem totalmente ruins, elas tem os dois lados. Por um lado eu fico pensando se isso não vai virar uma historia de vingança da Ivana e do Tufão, mas o que acho mais provável é ela se unir mais ao irmão. Na hora que esse segredo for revelado o mundo deles vai cair.

Você já tinha trabalhado ou tido contato com alguém do elenco antes de fazer parte da novela? Como tem sido esse convívio?
Tem sido uma coisa deliciosa. A gente não tem o tempo do teatro para criar elos, empatias e relações. Eu não conhecia ninguém, sou uma novata, mas fui muito bem recebida e acolhida. Viramos um time mesmo, aos poucos estamos nos conhecendo mais e tudo está ficando mais gostoso.

  • André Durão/UOL

    Letícia Isnard em ensaio para o UOL

No teatro você tem uma carreira mais consolidada. O que a televisão tem trazido de novo e importante para você como atriz?
Estou aprendendo muito todos os dias, intelectualmente está sendo muito interessante, por que é trabalhar com basena improvisação, mas é uma improvisação a longo prazo. Você improvisa o personagem por oito meses. E é difícil fazer bem. A aprendo muito vendo os outros atores. A Adriana [Esteves] é um desbunde, um monstro. Ela é capaz de fazer três expressões diferentes em poucos segundos no ar. É uma arte.

Como tem sido a reação do público a Ivana?
Nas ruas as pessoas sempre ficam me avisando para a Ivana tomar cuidado com o marido, que o Max não vale nada, para a Ivana abrir o olho. É uma alegria esse reconhecimento, um retorno que em 17 anos do teatro eu nunca consegui ter. Esse acesso a 40 milhões de pessoas toda noite é uma coisa incrível que só a televisão dá. E a resposta é imediata. Você bota o pé fora de casa e as pessoas vem falar. Existe também uma cobrança estética muito grande depois que você faz televisão.

Mas como essa cobrança é sentida por você?
A primeira coisa que as pessoas vem me falar é como eu pareço gorda na televisão. Mas e daí? Eu faço televisão porque eu sou atriz, não porque eu sou magra. Eu acho que essa coisa do modelo de beleza com o trabalho de atriz está colado demais, eu acho que deveriam separar um pouco melhor, senão fica a ditadura de um padrão estético que não tem nada a ver com a historia. Se estamos ali para contar historias de pessoas comuns deveríamos ter pessoas comuns representando. Não estou falando contra o padrão de beleza, mas a favor de não existir essa cobrança estética tão grande.

Você começou a aparecer na televisão depois dos 30. É bom fazer sucesso com essa idade?
Eu acho muito bom. A gente não perde a noção. Já pendurei muito refletor de teatro, já limpei muita privada de camarim, não tem como pirar. Eu não perdi a vivencia e o prazer de ser uma pessoa normal. Eu passei 37 anos sendo tratada como uma pessoa normal.  Eu não gostaria de não poder andar de metro e ônibus como eu ando.


 

UOL Cursos Online

Todos os cursos