Intérprete de Escobar em série, Wagner Moura defende legalização das drogas

Rio de Janeiro

Wagner Moura lembra bem da imagem de Pablo Escobar morto em um telhado em Medellín em 1993. Tinha 17 anos, vivia na Bahia e não tinha ideia de que o interpretaria duas décadas depois em uma série do Netflix.

Ao receber o papel, a primeira coisa que pensou foi: "Estou ferrado!", disse entre risadas o capitão Nascimento, policial honesto dos filmes "Tropa de Elite", em uma entrevista à AFP.

O ator brasileiro não falava espanhol e conhecia pouco da história do maior narcotraficante da história.

"Lembro de ter visto na televisão as bombas em Bogotá, lembro muito das imagens de Pablo morto no telhado da casa, porque é uma imagem muito forte para uma criança: um cara gordo em um telhado. Não sabia praticamente nada, o que aprendi sobre Pablo veio quando resolvi fazer o personagem", explicou o ator brasileiro de 39 anos.

Sem saber se receberia o papel, Moura ficou seis meses em Medellín para estudar o idioma e percorrer suas ruas, buscando captar a visão que ainda tinha do "Patrão".

O rústico sotaque "paisa" (como são chamados os nascidos na cidade) que ali adotou se "aportuguesou" agora que não tem mais os bigodes e o cabelo penteado de Escobar, embora ainda lute para perder os 20 quilos que ganhou para o papel.

Depois de evocar este duro capítulo da chamada guerra contra as drogas, não tem dúvidas de que "as drogas devem ser legalizadas", disse, lembrando que o chefão do tráfico também pensava assim.

A série se chama "Narcos" e em uma semana começará a ser transmitida pela plataforma de vídeos por streaming.

AFP: Do capitão Nascimento a Pablo Escobar, duas histórias muito diferentes, mas ambas sobre narcotráfico. Como se relacionam estes dois personagens?

Wagner Moura: São bem diferentes. Não consigo ver da perspectiva de um narcotraficante e de um policial. Para mim são dois caras, cada um com seu universo, com sua humanidade.

AFP: E encontrou a de Escobar?

WM: Pablo era um cara mau, mas era uma pessoa, tinha filhos, uma esposa, amigos, esse é o material que usei para recriar o personagem. Inclusive Pablo morreu por isso, porque estava falando com seu filho no telefone, sabia que a ligação poderia ser interceptada pelos americanos e ainda assim continuou falando.

AFP: Há inclusive quem o chame de 'Robin Hood'...

WM: Se você for ao bairro Pablo Escobar na periferia de Medellín, que é o bairro onde construiu casas para as pessoas, nas paredes das casas você encontra fotos com a cara de Pablo e ao lado a do menino Jesus. Na Colômbia há um antes e um depois de Pablo, e hoje os colombianos têm uma visão muito crítica, mas também há muitos que o veneram.

AFP: Qual foi a primeira coisa que você pensou quando soube que seria Escobar?

WM: Estou ferrado! (risos) Não, o que fiz foi ir à Colômbia, já havia começado a fazer aulas no Rio porque não falava nada de espanhol, mas era com um professor argentino, então falava tipo: "sho soy Pablo Escobar, sho hablo español".

AFP: Quanto tempo antes da filmagem foi para Medellín?

WM: Seis meses antes. Me matriculei na Universidade Bolivariana e comecei a ter aulas de espanhol de manhã e de tarde. Lia muita coisa sobre Pablo, há uma bibliografia extensa. Fiz tudo isso inclusive antes do Netflix me contratar. Pensei que se decidissem contratar um colombiano eu pelo menos teria aprendido outro idioma.

AFP: É uma história sobre a Colômbia contada por um olhar estrangeiro?

WM: O narcotráfico é uma realidade para todos os países latino-americanos, que sofremos com a política dominante da luta antidrogas que vem dos Estados Unidos e a série conta precisamente como isso começou, como se desenvolveu essa guerra antidrogas. A financiaram, a transformaram com os anos em uma guerra equivocada, especialmente para nós, porque é aqui onde as pessoas estão morrendo.

AFP: Como o problema deve ser encarado então?

WM: Eu acredito que as drogas devem ser legalizadas, é minha opinião. Como deveriam ser legalizadas? De que forma? Não sei. Não se trata de liberar, de ir à farmácia e comprar heroína. Os diferentes tipos de drogas devem ser tratados como casos diferentes, mas este é um processo inevitável. O Supremo Tribunal Federal está votando o consumo de maconha; o Uruguai já deu um passo gigante.

AFP: Depois de Escobar, existiu outro igual?

WM: Mesmo na época de Pablo, era uma pessoa diferente, não era o típico narcotraficante que trabalha nas sombras. Queria ser amado, aceito, era uma personalidade complexa. Inclusive Pablo dizia que as drogas seriam legalizadas, que seria um processo de 40 ou 50 anos, e os narcotraficantes se tornariam empresários.

AFP: Sentiu nestes 10 capítulos algo deste poder do 'Patrón'?

WM: Um pouco!.

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